26 fevereiro 2009

tempera a verdade com o julgamento


Proponho-me, então, definir o homem de elite português (e, mais geralmente, de cultura católica). Este post é a primeira contribuição, não esgosta o tema, o qual tenciono prosseguir em outros posts. A razão é que tenciono intercalar a caracterização do homem de elite português (católico) com a caracterização do homem de elite inglês ou americano (protestante). Embora não esgote o tema neste post, eu gostaria de afirmar que é ele que contém as ideias-mestras da caracterização que me proponho realizar, e constitui portanto o post principal sobre o assunto.

Utilizarei a forma de expressão por excelência da cultura católica, seguindo o modelo do seu grande filósofo, S. Tomás de Aquino - o diálogo. Imagino o diálogo com um jovem adulto de vinte e tal ou trinta e poucos anos de idade, chamado António.
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-António: Qual é a principal característica do homem de elite português?

-PA: A verdade. A ideia mais importante da nossa cultura católica, aquela que nos confere unidade, é a ideia de verdade. Portanto, o homem de elite português é, em primeiro lugar, o homem verdadeiro, o homem genuíno, o homem em que tudo nele respira verdade.

-António: E a segunda característica mais importante?

-PA: Julgamento. Capacidade de julgamento ou sensatez. É esta característica que faz dele um homem de elite e o distingue do povo, porque verdade também existe no povo. Portanto o homem de elite é o homem verdadeiro e sensato, o homem que tempera a verdade com o julgamento.

-António: E como é que se chega à verdade, pelos livros?

-PA: Pelos livros e pela reflexão, mas isso é só metade do processo. Se você quer ser um homem de elite, leia e medite. Leia sobretudo os clássicos da nossa civilização ocidental e cristã, os gregos, os romanos, os clássicos da era cristã, S. Agostinho, S. Tomás, Descartes, Locke, Hume, Kant, Tocqueville, etc. Não esqueça a Bíblia e o Catecismo. Lendo e meditando, você adquire sabedoria e aproxima-se da verdade. Mas não chega, falta a outra metade.

-António: E em que é que consiste a outra metade?

-PA: Em misturar-se com o povo. Não esqueça que o povo português é muito sabedor, é um povo que, em certo sentido, vive obcecado pela verdade. O que lhe falta é julgamento. Por isso, você tem muito a aprender com o povo. E só com o povo você pode praticar aquela qualidade de carácter que distingue a elite do povo - a capacidade para julgar.

-António: Como assim?

-PA: Observe o povo, fale com o homem e a mulher do povo, veja a forma como o povo se exprime, as suas manifestaçoes religiosas, as festas populares, analise a arte popular e oiça a música popular. Vai encontrar aí expressões de imensa sabedoria, embora quase sempre com falta de critério. É olhando para essas formas de expressão do povo, escutando o povo, e perguntando: "O que é que está ali a mais -, o que é que está ali de bizarro, de mau gosto, de injusto, de feio, de irracional, de ofensivo, de alarve, de calão - ou, o que é que falta ali - de harmonioso, de justo, de belo, de gentil, de sóbrio, de racional?" é que você vai praticar a sua capacidade de julgamento. Isto você não consegue praticar nos livros, excepto na literatura, na arte e na religiosidade popular.

-António: Tem escrito que a nossa elite está entre os professores ... só os professores é que podem ser elite?

-PA: Não, é uma força de expressão, um arquétipo. Os professores, pela natureza da sua missão, estão vocacionados, mais do que quaisquer outras pessoas, para procurar a verdade e a transmitirem aos outros com critério.

-António: O que é que quer dizer "com critério"?

-PA: Quero dizer com julgamento. Um professor não ensina às crianças do ensino básico cálculo diferencial, nem os Lusíadas. Elas precisam saber primeiro aritmética e história de Portugal, pelo menos. Aquilo que caracteriza o professor é a sua missão de procurar a verdade, e ser capaz de comunicar a verdade de forma selectiva.

-António: Quer dizer que a verdade não deve ser dita a todas as pessoas e em todas as circunstâncias?

-PA: Claro que não. Isso é o que faz o povo, não um homem de elite. Aquilo que caracteriza o homem de elite é precisamente a capacidade para julgar perante quem e em que circunstâncias deve comunicar a verdade, e perante quem e em que circunstâncias não deve comunicar a verdade, calando-se ou até, em certos casos excepcionais, falando mentira.

-António: Estou desconcertado ... um homem de elite a calar-se ou a mentir ... quer dar-me um exemplo?

-PA: Já lhe dei o exemplo acima das crianças do ensino básico. Tome outro: você é casado, tem três filhos menores, o seu patrão é um brutamontes que trata mal toda a gente. Você um dia chama-lhe brutamontes e ele despede-o - a sua mulher e os seus filhos vão sofrer. Você disse a verdade, faltou-lhe foi julgamento, porque considerações superiores se levantavam aqui acima da comunicação da verdade - a segurança da sua família. Quanto à mentira: um doente terminal pergunta ao médico se vai morrer brevemente, e o homem de elite responde-lhe que não, que para a semana estará melhor.

-António: Voltemos aos professores. Só eles é que podem ser elite?

-PA: Não. Qualquer homem pode ser elite - a elite brota do povo -, um médico, um jurista, um engenheiro, até um electricista e um homem do povo. Aquilo que ele tem de fazer é usar a missão do professor como modelo - procurar a verdade e comunicá-la aos outros com critério, isto é, com julgamento.

-António: Para encerrar esta primeira parte da conversa, gostaria de lhe colocar três perguntas sobre temas que andam em discussão na sociedade portuguesa, e para as quais gostaria de uma resposta breve e definitiva.

PA: Diga ...

-António: Pode um homem de elite português ser a favor do aborto?

-PA: Não, porque um homem verdadeiro assume as consequências dos seus actos, e convive com elas.

-António: Pode um homem de elite ser homossexual?

-PA: Não, porque um homossexual não é um homem verdadeiro.

-António: Pode um homem de elite ser favorável à eutanásia?

- PA: Não, porque um homem verdadeiro não precisa de ninguém que o ajude a morrer. Ele morre pelos seus próprios meios.
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(Nota: na imagem, Alexis de Tocqueville, um homem de elite da tradição católica)

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