01 fevereiro 2009

aquilo que está em causa



Não se passa de um regime de escol, como era o do Estado Novo, para um regime democrático de um ano para o outro. São necessários muitos anos, às vezes gerações, para que a cultura do regime anterior vá gradualmente desaparecendo e cedendo o lugar à cultura do novo regime.

Passados 35 anos sobre a Revolução do 25 de Abril, a cultura democrática está agora razoavelmente instalada no país, e os vestígios do antigo regime, bem como os homens que o fizeram, estão praticamente desaparecidos. Pode, por isso, afirmar-se, que nos últimos 50 anos pelo menos, nunca o povo português foi tão soberano, nunca as suas instituições, os seus governantes e a vida pública nacional reflectiram tanto os desejos, as vontades, a genuína cultura do povo português e o próprio povo português.

Por isso, no chamado caso Freeport, eu tenho ligado menos aos personagens, e mais aos processos e aos parâmetros culturais que esses processos encerram. Todos os governantes, a começar pelo primeiro-ministro, são escolhas do povo português e eles são, na minha opinião, bem representativos do povo português, como representativos do povo português são as pessoas que hoje comandam as instituições em Portugal, como, por exemplo, a justiça. Se estas pessoas não estivessem nos lugares que ocupam, outras estariam lá muito parecidas com elas. E se o caso Freeport não estivesse nas primeiras páginas dos jornais, estaria lá outro muito parecido com ele nos seus efeitos.

Aquilo que está em causa não é o primeiro-ministro José Sócrates, seja ele vítima ou culpado, nem o caso Freeport. Aquilo que está em causa é a democracia em Portugal. Se, por hipótese, o primeiro-ministro é culpado, a conclusão não pode ser senão a de que o povo português sabia, ou devia saber, quem escolhe para as mais altas funções do Estado. Se, também por hipótese, o primeiro-ministro está inocente, o povo português, agora representado pela sua imprensa livre, não passa de um vil caluniador.

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