25 novembro 2008

Incentivos e números


"À medida que o preço das casas cai, há cada vez mais americanos que devem mais dinheiro na hipoteca do que aquilo que as suas casas valem. Em tais circunstâncias, muitos americanos chegaram à conclusão de que faz sentido devolver as chaves ao banco do que continuar a pagar o empréstimo (...) A razão por que podemos ter quase a certeza de que os preços irão continuar a descer é porque os preços nunca deveriam ter subido os patamares que atingiram. Em todo o país os preços subiram do nível normal - duas vezes e meia o rendimento familiar - para um valor agressivo - quatro a cinco vezes o rendimento familiar", Obamanomics, John Talbott (página 92)

Enquanto lia esta passagem, questionei-me sobre se os portugueses têm a noção destes incentivos (pagamento da hipoteca vs penhora) e destes números (rendimento familiar vs valor do imóvel adquirido). Penso que não.

Primeiro, os portugueses permanecem preconceituados contra o aluguer e o pagamento da renda, em benefício do empréstimo e da prestação bancária. Contudo, se pensarmos bem, a partir do momento em que o valor do imóvel baixa do preço a partir do qual se estipulou o valor do empréstimo tomado pelo seu comprador, o pagamento da prestação bancária passa a representar um ónus financeiro, um custo de oportunidade, em relação à renda, mais baixa, que entretanto se pagará pelo arrendamento de um imóvel de categoria semelhante.

Segundo, a bancarização do mercado imobiliário português constitui um entrave à boa avaliação do preço dos imóveis. É verdade que se deixaram de vender apartamentos e moradias, mas aqueles que os desejam comprar ainda se deparam com preços terrivelmente inflacionados. Por outro lado, a iliteracia financeira existente em Portugal, adicionada ao "curto prazismo" em que habitualmente vivemos, faz com que os portugueses se endividem para além do razoável, muitas vezes adjudicando todo o salário de um dos conjûges ao pagamento dos mais variados empréstimos.

Ps: O que é que acontece em Portugal ao devedor hipotecário que deliberadamente se deixe penhorar? Em teoria, o devedor deixa de pagar o empréstimo e, em troca, entrega a casa que servia de garantia. Um negócio justo. Mas, na prática, quais são as consequências deste acto no seu historial bancário? Será que, no futuro, se quiser endividar-se, o poderá fazer novamente? Ou será que passará a fazer parte de uma qualquer lista negra partilhada entre os bancos?

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