03 outubro 2008

Cidadãos mansos


A propósito deste post do Joaquim, acerca do erro cometido pelos jovens acabados de entrar na vida activa que adquirem de imediato a sua própria habitação, post com o qual concordo absolutamente, gostava de partilhar convosco uma experiência profissional que tem sido particularmente frustrante e que demonstra algumas das consequências associados ao erro apontado pelo Joaquim e também referido aqui pelo ccz.

Este ano, estou a recrutar um comercial na banca. O perfil desejado é alguém sénior mas não demasiado sénior. A proposta em cima da mesa é simples: um salário fixo, uma remuneração variável e a habitual mordomia do telemóvel acrescida da utilização do carro da empresa em horário laboral. O salário fixo é competitivo, em geral, representando um prémio de 10 a 20% face ao salário fixo actual associado ao perfil desejado. A remuneração variável, paga mensalmente, tem o potencial de se tornar fantástica, ao estilo anglo saxónico, permitindo duplicar ou até triplicar o fixo.

Pois bem. Para minha incredulidade, sabem qual tem sido a primeira reacção dos candidatos ao lugar? "Mas então, e o meu ACTV?!" O ACTV é o crédito bonificado de que beneficiam os funcionários da banca no crédito à habitação. Pelo que já pude observar, há jovens bancários com empréstimos de centenas de milhares de euros!?! Por outras palavras, estas pessoas, entre os 30 e os 40 anos de idade, vivem aterrorizadas com a simples ideia de poderem perder o tesouro mais precioso que têm: o crédito bonificado que lhes permite poupar nos seus empréstimos à habitação. Enfim, eu compreendo o que lhes vai na cabeça e não os recrimino. Na mesma situação, provavelmente, reagiria da mesma forma.

Mas, com franqueza, como é que a sociedade portuguesa pode evoluir se é este o tipo de preocupação que assola a maioria das pessoas? Não pode. E o que se passa com os funcionários da banca, passa-se em todos os outros sectores de actividade. Se a população activa portuguesa entre os 20 e os 40 anos de idade não estivesse tão presa por este tipo de considerações, optando em alternativa pelo arrendamento, a nossa sociedade seria muito mais dinâmica e muito mais competitiva. Assim não e é mau que assim seja. Sobretudo agora, que o desemprego está a aumentar, situação em que os empregadores ficam em vantagem face aos empregados. Enquanto os primeiros podem esperar pela oportunidade certa, os segundos não.

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