11 setembro 2008

educação moral

Como pai de duas crianças ainda muito pequenas, tenho vindo a observar os processos que a sua educação moral tem seguido ao longo das suas breves existências. A educação moral, palavrão por vezes ostracizado por alguma intelligentsia de pacotilha, consiste, como é sabido, na aquisição de valores fundamentais de vida, que contribuem para a formação da autonomia de espírito e de uma personalidade saudável. Esses valores traduzem-se numa equilibrada noção do que está certo e errado, do justo e do injusto, do bem e do mal. Qualquer pai que se preze sabe que, na educação dos seus filhos, não existem relativismos, mas padrões que eles devem ser aconselhados a seguir, e sobre os quais devem ser estimulados a pensar. O livre-arbítrio não consiste em relativizar os valores fundamentais da nossa existência enquanto pessoas, mas em escolher aqueles que nos parecem mais adequados, no limite, afastando até os que são convencionalmente mais aceitáveis. Esse exercício só faz sentido quando se tem a liberdade suficiente para se poder escolher, o que implica uma razoável dose de compreensão dos valores que estão em causa, tarefa prioritária do processo educativo.

A Escola e a Família são os dois meios fundamentais para a aquisição dessas noções elementares. A Família é, cada vez mais, residual e desatenta. Circunstâncias de força maior, tais como, os empregos, os divórcios, a velocidade a que se move o mundo de hoje, impedem-nos frequentemente de prestarmos a atenção devida aos nossos filhos. A Escola, com raras excepções, educa para a aprendizagem instrumental, mas não é formativa. Nas últimas décadas, foi moda esvaziar a Escola de qualquer outra função que não fosse a de ensinar conceitos operativos. Muito devido à laicização da Escola, esta deixou de ensinar valores. Estes seriam supostamente transmitidos pelos Pais, se assim o entendessem, e adquiridos pelas crianças ao longo das suas vidas, num exercício abstracto de liberdade interior total, sem qualquer influência formativa das suas consciências.

Só que, como já foi dito, a Família dos nossos dias está muito longe de preencher as lacunas deixadas pela Escola. Uma criança, dos 5 aos 10 anos de idade, dedica mais tempo aos computadores, aos DVDs e à televisão, do que possivelmente aos pais. Por outras palavras, talvez os pais não tenham o tempo que desejariam para os seus filhos. E é naqueles entretenimentos que as crianças adquirem noções morais. Desde logo, familiarizam-se, de forma impressionante, com a idéia do mal. O mal (“os maus”, como dizem) está por todo o lado. Está presente nos filmes, nos desenhos animados, nos jogos de computador. E onde está o conceito do bem? Ele é muito vago e impreciso, e sempre deduzido por contraposição ao conceito do mal, que é firme e claro, e corporizado em inúmeras figuras infantis. Na verdade, ele é pictoricamente sedutor e emocionalmente atractivo, pelo que capta com facilidade a atenção de qualquer criança, que sabe perfeitamente quem são os “maus”, que identifica o que o mal é sem dificuldade de maior, mas, quando inquirida sobre o que possa ser o bem, tem ideias vagas e confusas.

Esta reflexão leva-me a crer que a laicização da Escola e da nossa sociedade não preencheu o vácuo deixado pelo abandono da educação moral religiosa. Esta partia sempre de valores morais positivos e de conceitos claros do bem e do mal. Baseava-se numa tradição comunitária, social e civilizacional experimentada por gerações e conceptualmente muito bem estereotipada, a que as crianças deixaram de ter acesso fácil. A formação moral das crianças beneficiava com isso. E, ao invés do que por aí se propagandeou, a educação religiosa infantil inserida no contexto da formação civil está longe de formatar a consciência dos futuros adultos e de lhes reduzir o livre-arbítrio. Cheios de ateus e incréus estão as sociedades do passado, onde predominava a educação moral religiosa, para o demonstrar.

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