17 abril 2008

liberdade

O pensamento de Pedro Arroja relativo à liberdade pode sintetizar-se na definição que o próprio nos oferece: A liberdade é a capacidade de fazermos o que temos obrigação de fazer. Pedro Arroja contrapõe esta definição ao conceito democrático de liberdade que equivaleria à capacidade de cada um fazer o que lhe agradar, conceito que corresponderia ao entendimento de autores clássicos como Mises e Hayek.
Num post anterior reflecti sobre esta visão do Prof. Pedro Arroja, dando a entender que necessitaria de mais elaboração para se tornar acessível. Ora com os esclarecimentos obtidos, podemos agora reflectir um pouco mais.

O problema da liberdade individual só surge em sociedade. No contexto social torna-se necessário definir o âmbito das acções legítimas que os indivíduos podem desenvolver sem coerção. A liberdade legítima está sempre limitada pela liberdade dos outros. Thomas Jefferson, o vulto que deu um cunho libertário à Constituição dos EUA, expressou este princípio do seguinte modo: “Nenhum homem tem o direito de agredir os direitos iguais dos outros, e isto é tudo o que as Leis o devem poder impedir de fazer”.

Neste sentido a liberdade individual nasce, desde logo, do cumprimento de uma obrigação imperativa, a de respeitar a liberdade dos outros. Dando por adquirido que a maior parte dos nossos concidadãos aceitarão este princípio, mesmo que de quadrantes políticos diversos, passemos ao capítulo que Jefferson entendia deixar à soberania individual.

No âmbito das suas vidas pessoais deverão os cidadãos adoptar a visão de Arroja ou a de Mises e Hayek? E serão estas duas visões antagónicas e irreconciliáveis? Foi sobre este aspecto que me debrucei. Deverão os cidadãos aceitar as obrigações de conduta, por exemplo da moral Católica, para serem livres, ou poderão, democraticamente, fazer o que lhes der na veneta?

Para responder a esta pergunta procurei inspiração em Rand. Para que serve a liberdade? A liberdade é um direito que resulta do direito inalienável à vida. Para garantir o direito à vida os seres racionais necessitam de ter liberdade de acção. Ora neste sentido a liberdade nunca é um fim em si, nem pode ser espontânea ou aleatória. Os seres racionais restringem as suas acções ao espectro dos comportamentos que lhes garantem a vida e de acordo com a natureza humana, a vida dos familiares e da tribo.
Se pelas suas acções, os seres humanos contribuíssem propositadamente para uma sociedade execrável, em última análise estariam a defraudar-se a si próprios e a pôr em risco as suas vidas e as dos seus. Não teriam um comportamento racional, condição sine qua non para usufruir de qualquer liberdade (mesmo da entendida por Arroja).

O pensamento de Pedro Arroja parece contrapor à sua visão da liberdade, como a possibilidade de fazermos o que temos obrigação de fazer, a liberdade como caos. Ora eu entendo, e submeto como tese, que a concepção libertária de liberdade tem subjacente um conjunto de obrigações implícitas que decorrem do que expus.
A liberdade de Arroja não poderia assim representar o oposto do conceito libertário, mas apenas um subconjunto mais restrito do conjunto que referi. Neste caso o subconjunto de obrigações explícitas que corresponderiam à moral Católica.
Vivendo nós num País de tradição Católica, é possível que a visão de Pedro Arroja possa encerrar uma mais valia significativa. A de tornar explícitos os comportamentos recomendáveis que de outro modo estariam apenas implícitos e ainda a vantagem de seleccionar também os comportamentos que, por tradição, mais se adequam à nossa cultura.

O único problema poderá ser o das minorias que sendo pacíficas e produtivas pretendam usufruir da liberdade alargada que a sua soberania lhes garante, sem terem de se submeter a ditames morais externos, mesmo que com a autoridade milenar da Igreja Católica.

Beneficiei muito das reflexões do Pedro Arroja. A fé dos clássicos na ordem espontânea levou-os a descurar a vertente das obrigações inerentes à liberdade, que sem dúvida lá estão implícitas. Pedro Arroja ajudou a esclarecer este aspecto e propôs uma alternativa que, na minha opinião, não é necessariamente antagónica à visão clássica, mas que a complementa e adapta à nossa cultura.

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