27 março 2008

cortar o mal pela raiz

Uma das primeiras coisas que se aprende em cirurgia é a analisar situações clínicas concretas e a decidir em função dos dados disponíveis. Após uma avaliação cuidadosa, o cirurgião elabora, e executa, um plano de tratamento específico para cada caso. Muitas vezes os diagnósticos são estabelecidos com base em poucos elementos diagnósticos e portanto a margem de erro é maior, mas o cirurgião não se deve afastar do curso definido até surgirem dados incontestáveis de que é necessário mudar de rumo.
Um caso paradigmático é o de um doente com uma simples apendicite aguda. O diagnóstico é estabelecido com uma elevada margem de erro, mas uma vez decidido operar prossegue-se com absoluta convicção. O apêndice é removido, apesar de estar normal em 10 a 20% dos casos, e o tratamento prossegue de acordo com o plano traçado. Não é boa prática protelar a operação à espera de mais dados, nem é possível na dúvida, tirar metade do apêndice.

Esta abordagem prática de situações complexas distingue a cirurgia da medicina e estabelece um paradigma para muitas outras situações concretas. Daí se falar com frequência de uma abordagem cirúrgica de problemas muito diversos.

E vem esta treta toda a propósito da baixa do IVA em um ponto, de 21 para 20%. No meu ponto de vista é um erro crasso. Parte da análise de uma situação extremamente complexa e volátil, como é a situação económica actual, constata a necessidade de uma intervenção que estimule o desenvolvimento, mas depois fica aquém do necessário. Tirou-se um terço do apêndice...
É uma actuação pouco cirúrgica e de resultados duvidosos. O impacto real sobre a economia é escasso, mas o impacto sobre as expectativas é grande. Transmite a ideia de pânico no Governo e antecipa problemas ainda para 2008. Ora estas expectativas têm o efeito contrário do que se pretende e mais do que neutralizam a diminuição do IVA. E depois que necessidade havia de anunciar a medida a prazo? Porque não imediata?

Teria sido útil um regresso aos 19% do IVA, um corte no IRC e talvez um reembolso fiscal para as famílias de menores rendimentos. Os pequenos passos mostram falta de capacidade e o pior é que não resultam. A situação actual não vai lá com aspirinas.

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