10 dezembro 2007

Proto-Liberalismo

Portugal é geralmente considerado um País colectivista e o predomínio do pensamento político socialista que caracteriza o centrão parece expressar esta realidade. Por isso, o liberalismo não passa de um pensamento ultra-minoritário e até as suas luminárias se interrogam se algum dia pode vir a ter qualquer expressão entre nós.

Há porém discrepâncias que ameaçam esta visão paradigmática da nossa sociedade e colocam dúvidas sobre a sua validade. Numa sociedade colectivista a maior parte das pessoas aceita colocar o colectivo acima dos interesses individuais e portanto submete o seu próprio comportamento aos ditames do interesse geral.

Em Portugal, contudo, esse tipo de comportamentos é excepcional. Os nossos concidadãos preocupam-se sobretudo e quase exclusivamente consigo próprios e estão-se nas tintas para os outros. Para quem vive em Portugal não será necessário demonstrar esta realidade pela sua evidência e quem nos visita não levará muito tempo a chegar à mesma conclusão pela análise do nosso comportamento em sociedade.

Como explicar então o peso político do socialismo numa sociedade radicalmente individualista? A minha tese é que o socialismo em Portugal tem apoio popular apenas porque é visto como uma estrada de um só sentido. A malta vota nas políticas do centrão enquanto estimar que pode continuar a receber do Estado mais do que aquilo que contribui e portanto o socialismo serve apenas os interesses dum despudorado individualismo radical.

Enquanto mantivemos a nossa soberania monetária foi talvez possível alimentar esta ilusão. Agora a realidade bateu à porta! Colectivamente não é possível irmos buscar ao Estado mais do que o que lá pomos e portanto surge um problema de gestão de expectativas.

O individualismo nacional não atingiu contudo a maturidade do individualismo anglo-saxónico. É um individualismo mamão e infantil, dependente e umbilical. Os cidadãos olham apenas para o seu umbigo e para os seus interesses mais mesquinhos, sempre à espera da mama e sem largar o colo maternal. O Estado é a grande matriarca!

A resistência às ideias liberais não resulta do espírito colectivista mas sim da falta de amadurecimento do nosso individualismo. Não estamos dispostos a aceitar regras nem a respeitar os direitos dos outros porque estamos apenas preocupados com os nossos interesses imediatos. A falta de respeito pelo direito à propriedade privada, que Adam Smith correctamente identificou como o direito mais sagrado de todos, não é uma postura ideológica mas apenas uma atitude de infantes que querem os brinquedos dos outros e que têm de ser metidos na ordem.

Neste momento, Portugal atravessa uma fase de mudança cultural. A principal virtude do actual Governo foi demonstrar com a sua praxis que o socialismo é uma estrada de dois sentidos. Quando esta percepção for compreendida penso que o apoio às políticas socialistas do centrão desaparecerá subitamente numa espécie de buraco negro.

Revelar-se-à então a natureza individualista da nossa cultura que por estar ainda num estado primitivo deve ser designada como proto-liberal. Colectivista é que nunca!

Autor: Joaquim Sá Couto, enviado por e-mail

Sem comentários: