21 novembro 2007

arranjou as duas

Não é a primeira vez que os EUA falham as suas responsabilidades de banqueiro central do mundo. Já o tinham feito em 1971, sob a administração Nixon. Os EUA foram o único grande país cuja capacidade produtiva não foi afectada pela II Grande Guerra. Por isso, eles estavam destinados a desempenhar uma função de privilégio no sistema financeiro internacional. No célebre acordo de Bretton Woods (1944) ficou estabelecido o seguinte entre os países aderentes.

O banco central americano (Fed) emitiria dólares contra a aquisição de reservas em ouro. O banco central de qualquer outro país aderente (v.g., o Bundesbank da Alemanha) emitiria a sua própria moeda (marcos) contra a aquisição de ouro ou de dólares - activos que constituiriam as suas reservas. O preço do ouro era fixo (US$35 por onça), e fixas eram também as taxas de câmbio entre as moedas dos países aderentes.

Para o público, as moedas dos países aderentes não eram convertíveis em ouro. Mas eram convertíveis em ouro entre bancos centrais. Qualquer banco central (v.g., Banco de França) que acumulasse moeda de outro país (v.g., escudo português), poderia chegar junto do respectivo banco central (Banco de Portugal) e exigir a sua conversão em dólares ou em ouro. E todos os bancos centrais que acumulassem dólares poderiam chegar junto do Fed e exigir a sua conversão em ouro.

Durante os anos 60, os EUA tiveram de financiar a guerra do Vietname. Ao mesmo tempo, para estimular a economia, adoptaram uma política de taxas de juro controladas, que fez fugir para a Europa uma quantidade considerável de dólares em busca de melhor retorno. Os bancos comerciais da Europa recebiam estes dólares e apresentava-nos para conversão junto dos respectivos bancos centrais (v.g., Bundesbank). Num só dia em 1971, o Bundesbank recebeu mais de US$2 biliões para conversão em marcos - conversão que ele satisfazia imprimindo marcos em troca e inflacionando a sua própria economia.

Foi, então, que acumulando dólares sem cessar, em Agosto de 1971, o Bundesbank decidiu solicitar ao Fed, nos termos do acordo de Bretton Woods, que este lhe trocasse os dólares por ouro. Em lugar do Fed, foi o Presidente Nixon que respondeu, dizendo que não trocava, porque os EUA não tinham reservas de ouro suficientes para fazer face à conversão. Em lugar de emitirem dólares contra ouro, os EUA tinham andado a emitir dólares contra papel - títulos da dívida pública - para financiarem a guerra do Vietname e a política económica expansionista.

Assim, até 1971 a emissão monetária de qualquer país estava garantida por dólares e, em última instância, por ouro. A partir daí passou a estar garantida por dólares apenas. Por detrás do dólar, onde antes estava ouro, agora passou a estar ar puro - ou a confiança de que o governo americano não arranjaria uma guerra, ou uma política expansionista da economia, para emitir dólares em excesso. A verdade é que, sob a Administração Bush, o governo americano arranjou as duas.

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