19 setembro 2007

Hayek e o Chile


Pouco anos depois de chegar ao poder no Chile em 1974, Pinochet chamou para o governo vários economistas que se tinham formado na Universidade de Chicago, cuja liderança pertencia já então ao economista Milton Friedman (Prémio Nobel da Economia, 1976) - os chamados Chicago boys.

Um vasto programa de liberalização da economia, que se encontrava fortemente estatizada sob o regime democrático de Allende, que incluiu a privatização de empresas públicas, a entrega ao sector privado de áreas de actividade até aí desempenhadas pelo sector público, e até genuína inovação em matéria de política social - como foi o caso da reforma da segurança social -, em breve tornariam o Chile o país de maior crescimento, não só na América Latina, mas em todo o mundo ocidental.

Friedman nunca mais se libertou da reputação de ter posto o seu capital intelectual ao serviço de um regime autoritário, e ele próprio, que era um argumentador sagaz - na minha opinião, o maior de entre todos os economistas - nunca conseguiu responder satisfatoriamente ao dilema de que a prosperidade económica do Chile, baseada na liberdade, não era acompanhada na esfera política por um regime de liberdade - a democracia.

Hayek não fez melhor. Recordo uma entrevista (cito de memória) em que, tendo-lhe sido perguntado porque é que o regime de liberdade económica no Chile não era acompanhado de um regime de liberdade política, Hayek não teve resposta e utilizou uma escapatória, afirmando que o regime autoritário de Pinochet representava, talvez, apenas uma fase transitória para a democracia.

E embora assim tenha sucedido - o próprio Pinochet anunciou várias vezes, e cumpriu, a promessa de reinstaurar um regime democrático no país - a verdade é que o Chile democrático nunca mais voltou a ser a estrela do firmamento económico que fora sob o regime de Pinochet.

Na minha opinião Hayek e Friedman nunca compreenderam o ponto crucial da questão, em parte porque um e outro - talvez mais Friedman do que Hayek - tinham uma certa tendência para aplicar receitas económicas, irrespectivamente da cultura do país a que eram dirigidas. Ou então, não tiveram, na altura, a coragem suficiente para afirmar a realidade - embora eu me incline mais para a primeira do que para a segunda possibilidade.

Na minha opinião, a realidade é a de que um país de tradição católica, outros factores sendo iguais, tende a prosperar muito mais sob um regime de autoridade pessoalizada, do que sob a democracia. E a razão, como procurei argumentar no meu post anterior, é a de que a democracia, sobreposta à tradição de liberdade individual que é característica destes países, não consegue conter os excessos da liberdade - e acaba a levar o país, primeiro, para a estagnação económica, depois para a anarquia e, eventualmente, para a ruína.

Não surpreende, por isso, que, nos últimos dois séculos, o período de maior crescimento económico em Portugal tenha sido o de Salazar, em Espanha o de Franco, na Argentina o de Peron e no Chile, o de Pinochet.

Sem comentários: