Ilustrarei este enviesamento cultural dos rankings com um dos índices que mencionei - o índice da qualidade de vida nas cidades, o qual é baseado em 39 indicadores que vão desde a disponibilidade de equipamentos recreativos até à estabilidade política. De acordo com este índice a melhor cidade do mundo é Zurique, seguindo-se Geneva, Vancouver, Viena, Auckland, Dusseldorf, Frankfurt, Munique, Berna e Sidney - todas pertencentes a países de cultura maioritariamente protestante. A excepção é Viena, situada num país católico que, não obstante, é um enclave entre países maioritariamente protestante.
A dezena seguinte inclui, por esta ordem, Copenhaga, Wellington, Amsterdão, Bruxelas, Toronto, Berlim, Melbourne, Luxemburgo, Ottawa e Estocolomo - todas ainda pertencentes a países de cultura predominantemente protestante.
As dez seguintes são Perth, Montreal, Nuremberga, Calgary, Hamburgo, Oslo, Dublin, Honolulu, S. Francisco e Adelaide - uma cidade de cultura católica, Dublin, embora um tanto desnaturada, metida como está entre países de cultura protestante.
A seguir, mais dez: Helsínquia, Brisbane, Paris, Singapura, Tóquio, Boston, Lyon, Yokohama, Londres e Kobe - aqui já encontramos duas cidades do país que define a fronteira entre cultura protestante e a cultura católica.
E agora as sete seguintes, sempre por ordem do ranking: Barcelona (41ª: urrahhh), Madrid (42ª: urrahhh), Osaka, Chicago, Washington, Portland e Lisboa (47ª: urrahhhh). Nem uma cidade italiana.
Eu interrogo-me se existe alguém, que não seja uma excepção, pertencente aos países de cultura católica, que deseje viver duradouramente (refiro-me a viver duradouramente, e não simplesmente visitar ou viver por um período curto) numa cidade como Helsínquia, Copenhaga, Vancouver, mesmo Zurique ou Geneva, Bruxelas, Oslo, de preferência a uma cidade como Barcelona, Madrid, Florença, Roma, ou mesmo Lisboa e Porto.
Em Toronto, com sete meses de neve por ano e temperaturas médias de 20 graus negativos? Em Oslo, onde os empregados dos restaurantes põem os clientes na rua às dez da noite porque é hora de fechar? Em Ottawa, onde é proibido beber alcool a partir da uma manhã e, por isso, não há sequer discotecas abertas depois dessa hora? Em Geneva, onde não se pode assar sardinhas porque o vizinho da casa ao lado faz queixa à polícia? Em Boston, onde quem puxar de um cigarro é olhado como um criminoso? Em Singapura, onde fumar um charro significa ir longos anos para a cadeia? Em Bruxelas, essa cidade de burocratas e chuva miudinha permanente? Em Estocolomo, onde no inverno é noite todo o dia e, no verão, dia toda a noite? Em Helsínquia, onde no restaurante, após o jantar, se pedir um digestivo que seja típico do país, lhe servem um grande copo com uma bebida a saber a cereja e, ainda por cima, quente?
São estas as boas cidades? Nem uma italiana, só duas espanholas, só uma portuguesa?
Enfim, se os indicadores e os rankings fossem elaborados por analistas de países de tradição católica, as cidades portuguesas seriam muito mais valorizadas e Portugal, ele próprio, estaria muito melhor classificado do que cerca da 30ª posição do ranking dos melhores países do mundo. Na realidade, no meu próprio ranking, os três melhores países do mundo para (eu) viver são, por esta ordem: Espanha, Portugal e Itália. E, a seguir, está o Brasil.
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