01 agosto 2007

no armário


Descartes é, na minha opinião, o pai inquestionável do ateísmo e do agnosticismo modernos. Não vale a pena esconder, ele vibrou um golpe duríssimo na Igreja Católica e na religião em geral, e não é certo que até hoje a Igreja tenha recuperado dele.

Ele propôs-se demonstrar racionalmente a existência de Deus. Produziu três demonstrações. Naturalmente, nenhuma delas era convincente porque, se fosse, ele não necessitava de três. Ainda hoje, o agnóstico ou o ateu típicos colocam a questão de forma cartesiana para justificar o seu ateísmo ou o seu agnosticismo: "Você é capaz de demonstrar a existência de Deus?". E a realidade é que ninguém consegue demonstrar a existência de Deus, mais do que os meus alunos podiam demonstrar os axiomas da teoria das probabilidades. Deus é indemonstrável pela razão, está acima dela, é um axioma.

Aquilo que se pode demonstrar pela razão é uma coisa diferente - a necessidade da ideia de Deus. Deus é uma necessidade da razão. Sem saber onde iria chegar, esse tem sido o meu caminho desde que há cerca de um ano comecei a escrever no Blasfémias. Eu posso não ter sido capaz de o transmitir aos meus leitores - em parte, porque eu próprio não sabia onde seria levado -, mas eu estou hoje genuinamente convencido de que não é possível uma sociedade humana sem a ideia de Deus.

A escolha é simples. Uma sociedade humana, qualquer sociedade humana, para ser viável, precisa da ideia de Deus (e, na realidade, todas as sociedades conhecidas na história da humanidade possuem, pelo menos, um Deus) e uma sociedade sem a ideia de Deus é uma sociedade impossível. E incumbe agora aos ateus e aos agnósticos demonstrarem, por argumento racional e lógico - e, em seguida fornecerem exemplos na história - de que uma sociedade humana é possível sem a ideia de Deus. Estou razoavelmente seguro que vão ter a vida muito difícil.

É a convicção de que toda a sociedade humana necessita da ideia de Deus que hoje me exaspera em relação aos líderes do pensamento liberal moderno - Hayek, Mises, Rothbard, Rand, Friedman -, e que num post anterior me levou a ser particularmente duro em relação a eles, a tal ponto que o Rui A. saltou na caixa de comentários para me conter.

A sociedade que eles advogam, para ser viável, precisa de um Deus - embora, depois de ter um Deus, não seja mais igual à sociedade que eles advogam . E eles, que tinham Deus ali à mão - o Deus judaico-cristão ou, simplesmente, o Deus cristão - resolveram metê-lo no armário, e nunca o tiraram de lá.

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