05 julho 2007

Liberdade

Na definição de Mises, o termo "liberdade refere-se à esfera dentro da qual cada homem actuante se encontra em posição de escolher entre modos alternativos de acção. Um homem é livre enquanto lhe seja permitido escolher fins e os meios a serem usados para a prossecução desses fins. A liberdade de um homem é sobretudo restringida pelas leis da natureza e pelas leis da praxeologia". (Human Action, op. cit., p. 279).
Para Mises, então, a liberdade de um homem consiste em ele fazer aquilo que quer, apenas limitado pelas leis da natureza (v.g., um homem não pode voar porque não tem asas) e pelas leis da ciência da acção humana (praxeologia) que ele se propõe construír, as quais são sobretudo leis económicas (v.g., não é possível contrariar as leis da oferta e da procura).

Esta é uma noção vulgar de liberdade e, por isso mesmo, muito apelativa ao homem comum. Ela não tem comparação com a noção católica de liberdade, a qual, na minha opinião, é uma obra de arte do espírito humano - uma noção elaborada, subtil, cheia de segredos umas vezes, outras vezes quase óbvia, multifacetada mas sempre coerente, amadurecida e refinada pelos séculos, um verdadeiro património da história intelectual da humanidade.
Na definição de Mises, a liberdade é um estado, um círculo (esfera, nas palavras do autor) desenhado em torno de cada homem e dentro do qual ele pode fazer como lhe aprouver. Nesta concepção, a liberdade de cada homem depende dos outros homens, porque eles podem decidir, por exemplo, pela via democrática, aumentar ou diminuir o círculo da sua liberdade e o da liberdade de todos os outros homens.

Pelo contrário, na concepção católica, a liberdade é um ideal, um cume no cimo de um monte e que, uma vez atingido, permite a cada homem decidir e agir de acordo com a sua consciência. Nesta concepção, a liberdade de um homem não depende de outro, menos ainda de uma decisão democrática. Depende apenas dele e do seu desejo para ser um homem livre.
Na concepção vulgar de Mises, a liberdade acaba por se reduzir a um conjunto de direitos positivos que definem o círculo de liberdade de cada homem. Quando os círculos de liberdade de dois homens se intersectam e o conflito emerge, a lei e os legisladores são chamados a intervir para os regular e demarcar. A prazo, numa sociedade democrática, os círculos de liberdade tenderão a ser iguais para todos os homens e a liberdade tende a assumir a forma de um catálogo colectivo de direitos positivos que são reconhecidos a todos.

Na concepção católica de liberdade tudo é diferente. Não existem nem direitos, nem legisladores, menos ainda direitos colectivos. Existem caminhos para a liberdade e cada homem possui o seu - que é a sua própria vida. Ao percorrer este caminho, subindo a colina da vida, cada homem vai abandonando todas as formas de escravidão - a escravidão às necessidades de subsistência, aos interesses materiais, aos grupos de interesse e de pressão, aos chefes e aos patrões, às clientelas partidárias e à multidão. Chegado lá acima, atingido o cume, ele é um homem livre. Ele não depende de ninguém. Ele pode finalmente decidir e agir de acordo com a sua consciência, sem quaisquer pressões, restricções ou impedimentos.

Esta é uma verdadeira concepção individualista da liberdade. Existe um caminho para cada homem e um cume para cada um, que é tão alto quanto ele o desejar. A própria Igreja fornece um padrão. É o Papa, o qual está colocado num cume elevadíssimo de liberdade que todos podem ambicionar e imitar. Numa comunidade de homens livres, e em que a liberdade é definida assim, não existem conflitos, ou eles são reduzidos ao mínimo, porque todos fazem, não aquilo que querem, mas aquilo que têm de fazer, segundo os ditames da sua própria consciência, e sem obediência a quaisquer outros ditames.

3 comentários:

Anónimo disse...

No fundo só se é verdadeiramente livre quando se é tocado pela fé. E, é-se tanto mais livre quanto mais religioso se for.

4 hero

Anónimo disse...

Muita religiosidade é completamente diferente de fanatismo religioso.

4 hero

PintoRibeiro disse...

Se calhar acerta o 1º. anónimo...
Boa noite,