Existem dois países no Portugal dos nossos dias: Norte e Sul, em linguagem figurada naturalmente, ou, se preferirmos, invertendo os vocábulos, capital e província, cidade e parvónia, Lisboa e o resto. Num país progressivamente empobrecido, o que distingue estas duas realidades? A renda, certamente, mas não só ou nem tanto isso. Mais do que a renda, é a sensação instalada de ausência de importância das partes, de protagonismo e de estatuto da periferia em relação ao centro. A noção de esvaziamento, de esvaimento, e de que o pequeno poder que ainda sobra a esta comunidade que é Portugal existe apenas num único ponto do país: o poder do carimbo, da decisão, das empresas que ainda vão gerindo o que sobra do Estado, das instituições públicas e, por centrifugação, das poucas empresas privadas com espessura que querem sobreviver. Esta falta de uma saudável competição que marcou Portugal durante décadas e que foi parte da explicação de algum do seu desenvolvimento regional e nacional então sucedido, acelerou o empobrecimento do país e contribuiu para a perda de qualidade da vida dos portugueses. Hoje, fora da capital, a paisagem humana e geográfica começa a ser deprimente, a fazer lembrar as sociedades do subdesenvolvimento terceiro-mundista do antigo bloco de leste: empresas falidas e fechadas, fábricas enormes abandonadas, prédios inteiros nas baixas das cidades entaipados, onde outrora, num passado recente, existiram pontos prósperos de comércio e serviços, mendigos em abundância, gente que se percebe estar a viver momentos de extrema dificuldade. Se não se inverter rapidamente a tendência, o panorama alastrará em breve à capital. Por isso, a grande reforma que é necessário fazer em Portugal é a da própria estrutura do Estado e do seu modelo centralista agravado nos últimos anos, possibilitando um país onde a competição exista e seja sustentada por partes com posições de importância relativamente equivalentes. A isso chama-se regionalização.
Sem comentários:
Enviar um comentário