12 fevereiro 2006

afinal, sempre existem coincidências

Assinalemos apenas os factos.
Umas caricaturas de segunda categoria, publicadas num jornal de terceira, num país periférico da Europa comunitária, incendiaram o mundo islâmico, deprimiram a Europa, fizeram ministros de países democráticos afirmar disparates sobre a liberdade, levaram ao encerramento de um site sueco pelas autoridades locais, fecharam embaixadas e provocaram manifestações públicas nos países europeus de dezenas de milhares de muçulmanos que por lá vivem livremente. Pelo caminho, alguns líderes islâmicos ofereceram ouro pelas cabeças dos «criminosos» caricaturistas e pela pele de cidadãos dinamarqueses que eventualmente sejam capturados nos países islâmicos, o que fez o governo da Dinamarca aconselhar aos seus concidadãos o abandono da maior parte desses países, entre eles, da própria Indonésia. Hoje mesmo, um jornal norueguês que publicou os blasfemos desenhos pediu formalmente desculpas à comunidade muçulmana por o ter feito, e soube-se também que uma sondagem realizada na Dinamarca condenou maioritariamente a publicação das caricaturas e a grave ofensa que elas veicularam. Note-se que os desenhos tinham sido originariamente publicados em Setembro, muito tempo antes destas reacções «espontâneas» de repúdio contra o mundo ocidental, num país onde vivem livremente milhares de muçulmanos, sem que se tenha tido notícia de quaisquer protestos imediatos.
Duas semanas depois de rebentar a crise, surge um novo documento a «provar» a «selvajaria» dos ocidentais e o desrespeito que, afinal, demonstram ter pelos direitos humanos: um vídeo com soldados ingleses no Iraque a espancarem alguns jovens iraquianos que se manifestavam contra a sua presença. Tony Blair já anunciou que irá proceder a um inquérito rigoroso e que os responsáveis serão levados à justiça. Não se adivinha, porém, que esta intenção do primeiro-ministro britânico consiga acalmar a indignação que, a Oriente e a Ocidente, as imagens já começaram a provocar. O Ministro Freitas do Amaral ainda não disse nada, mas não tardará certamente a fazê-lo, para nos tranquilizar as consciências e pôr de bem com a vida. Mais uma vez, é de notar que o vídeo, indiscutivelmente verdadeiro, tem já dois anos de existência, surgindo agora no seguimento imediato da crise provocada pelas caricaturas.
Afinal, ao que parece e ao invés do que se julgava, sempre existem coincidências. Aguardemos temerosamente pela próxima.

3 comentários:

rui a. disse...

Obrigado pelo reparo, caro Manuel.

Manuel disse...

Caro Rui, em primeiro lugar uma correcção: parece-me que a publicação desses tais cartoons ocorreu em Setembro, não em Dezembro.
E em segundo lugar uma observação: o filmezinho agora tão oportunamente divulgado parece ter sido feito por alguém que acompanhava os militares (se fosse um estranho eles nunca permitiriam aquela filmagem). Com toda a probabilidade, quem levava a câmara era um militar.
Especulando, creio não ser exagerado pensar que esse filme, e muitos outros, pertenceria aos serviços...
O mundo das secretas, militares ou civis, é muito complicado.
Evidentemente que o momento é escolhido, e nada do que acontece surge por acaso.
E a quem serve, e quem está a fomentar, esta estratégia da tensão?

António Torres disse...

Poissss....

O que os soldados fizeram não lhes fica bem.
E este ministro, ficará bem ao país?
Ou há uma deriva de senilidade acelerada, ou então não se percebe que razão biológica ligará assim os neurónios...