E se, ao invés do que tem vindo reiteradamente a afirmar o meu bom amigo CAA, Jorge Sampaio tivesse sido um bom e não um mau Presidente da República? Imagino que a hipótese possa parecer bizarra, mas é defensável. Vejamos porquê.
Sampaio foi Presidente num sistema semipresidencial atenuado por dez anos de duas maiorias parlamentares do PSD, que levaram Mário Soares, então Presidente, a diminuir aquilo que muito provavelmente gostaria que tivesse sido o seu protagonismo político.
Sampaio não era, ao contrário de D. João VI com quem o CAA não se cansa de o comparar, chefe do governo. Não lhe competia, por conseguinte, governar, nem tinha aí responsabilidades, ficando essa função reservada ao governo propriamente dito, suportado pelo parlamento.
No sistema semipresidencialista que a revisão constitucional de 1982 nos legou, os poderes do Presidente dependem mais da interpretação que o titular deles faça, do que propriamente da letra da Constituição. Nessa medida, tanto pode o papel do Presidente ser maximizado, aproximando-o do modelo semipresidencialista francês, através de um efectivo e diário acompanhamento fiscalizador e, indirectamente, orientador da acção do governo, como pode ser minimizado, aproximando-o, então, da matriz parlamentar, onde o Presidente é pouco mais do que um símbolo do Estado, intervindo somente em momentos de excepção.
Sampaio escolheu visivelmente a segunda possibilidade. O que é de louvar se tivermos em conta as suas origens políticas e partidárias, e, mesmo até, o temor que a sua primeira eleição suscitou nalguma direita. Quando, sem que nisso tenha tido a mínima responsabilidade, o governo de Barroso caiu, Sampaio escolheu a solução parlamentar, contra a orientação maioritária do seu partido e, como se veria meses mais tarde, do sentimento político do país de então. Quando dissolveu a Assembleia fazendo cair o governo de Santana, ninguém se admirou. Nem o próprio Primeiro-Ministro, que hoje reconhece que o poder executivo, em democracia, deve ser sempre conquistado e não recebido em herança.
Mas Sampaio poderia ter escolhido outra via: ter-se imposto aos sucessivos governos que tutelou. Teve espaço para isso quer nos dois governos socialistas, ambos sem maioria absoluta na assembleia, como nos dois de direita, resultantes de uma coligação do PSD com o CDS impensável horas antes dos resultados eleitorais, e que deu em vários momentos pretextos para intervenções presidenciais. Não o fez e fez bem em não o ter feito.
Sampaio foi Presidente num sistema semipresidencial atenuado por dez anos de duas maiorias parlamentares do PSD, que levaram Mário Soares, então Presidente, a diminuir aquilo que muito provavelmente gostaria que tivesse sido o seu protagonismo político.
Sampaio não era, ao contrário de D. João VI com quem o CAA não se cansa de o comparar, chefe do governo. Não lhe competia, por conseguinte, governar, nem tinha aí responsabilidades, ficando essa função reservada ao governo propriamente dito, suportado pelo parlamento.
No sistema semipresidencialista que a revisão constitucional de 1982 nos legou, os poderes do Presidente dependem mais da interpretação que o titular deles faça, do que propriamente da letra da Constituição. Nessa medida, tanto pode o papel do Presidente ser maximizado, aproximando-o do modelo semipresidencialista francês, através de um efectivo e diário acompanhamento fiscalizador e, indirectamente, orientador da acção do governo, como pode ser minimizado, aproximando-o, então, da matriz parlamentar, onde o Presidente é pouco mais do que um símbolo do Estado, intervindo somente em momentos de excepção.
Sampaio escolheu visivelmente a segunda possibilidade. O que é de louvar se tivermos em conta as suas origens políticas e partidárias, e, mesmo até, o temor que a sua primeira eleição suscitou nalguma direita. Quando, sem que nisso tenha tido a mínima responsabilidade, o governo de Barroso caiu, Sampaio escolheu a solução parlamentar, contra a orientação maioritária do seu partido e, como se veria meses mais tarde, do sentimento político do país de então. Quando dissolveu a Assembleia fazendo cair o governo de Santana, ninguém se admirou. Nem o próprio Primeiro-Ministro, que hoje reconhece que o poder executivo, em democracia, deve ser sempre conquistado e não recebido em herança.
Mas Sampaio poderia ter escolhido outra via: ter-se imposto aos sucessivos governos que tutelou. Teve espaço para isso quer nos dois governos socialistas, ambos sem maioria absoluta na assembleia, como nos dois de direita, resultantes de uma coligação do PSD com o CDS impensável horas antes dos resultados eleitorais, e que deu em vários momentos pretextos para intervenções presidenciais. Não o fez e fez bem em não o ter feito.
Acresce que no uso das suas funções, Sampaio soube sempre separar o que era estritamente do domínio público do seu domínio privado: a sua mulher foi sempre discretíssima, ao contrário das de outros no passado, e dos seus filhos não se ouviu quase falar, ao contrário, também, dos de outros no passado recente. Parecem aspectos menores mas, a meu ver, são de relevo para quem reclama uma República civilizada e uma separação total entre a classe política e a sociedade civil.
É certo que Sampaio pode ter tido hesitações e actos menos louváveis. Em dez anos de funções, quem os não teria? É certo, também, que Sampaio não foi o homem que «pôs o país na ordem». Graças a Deus, embora reconheça que isso faz mossa a alguma direita incapaz de cuidar de si mesma, sempre à espera do «homem providencial». Mas não há dúvida que os seus dois mandatos exibiram o que deve ser um Presidente da República em semipresidencialismo «light», próximo do parlamentarismo. Antes assim, do que o contrário. Lembremo-nos, por exemplo, do que foram os dois mandatos do General Eanes, ou a segunda parte do segundo mandato de Mário Soares, e, talvez, os dois mandatos de Sampaio ganhem outra dimensão.
É certo que Sampaio pode ter tido hesitações e actos menos louváveis. Em dez anos de funções, quem os não teria? É certo, também, que Sampaio não foi o homem que «pôs o país na ordem». Graças a Deus, embora reconheça que isso faz mossa a alguma direita incapaz de cuidar de si mesma, sempre à espera do «homem providencial». Mas não há dúvida que os seus dois mandatos exibiram o que deve ser um Presidente da República em semipresidencialismo «light», próximo do parlamentarismo. Antes assim, do que o contrário. Lembremo-nos, por exemplo, do que foram os dois mandatos do General Eanes, ou a segunda parte do segundo mandato de Mário Soares, e, talvez, os dois mandatos de Sampaio ganhem outra dimensão.
7 comentários:
pois é... uma coisa é o homem, outra o cargo. No cargo esteve prestes a meter o pé em ramo verde por amiguismo partidário mas lá se conteve...
(no caso da justiça o incómodo parece ser grande)
o mais controverso parece ter sido a dissolução da Assembleia. De facto, logicamenta a fazê-lo deveria ter sido à primeira, quando o Durão dei à sola. Mas vendo os acontecimentos a posteriori dá para imaginar a escandaleira eleitoral que também poupou...)
É Zazie, mas mesmo na altura dava para perceber que o homem estava a privilegiar a componente parlamentar sobre a presidencial do sistema. Permitiu que a Assembleia encontrasse uma solução de governo sem recurso a eleições antecipadas. Quer o Eanes, quer o Soares dificilmente teriam resistido a convocar eleições antecipadas.
A meu ver, Sampaio presidenciou quase sempre com muito tacto e a sua interpretação do papel que PR deve desempenhar no nosso sistema político está muito próxima da que faço.
A dissolução da Assembleia foi inevitável, mas da inteira responsabilidade de Santana Lopes e do seu governo de coligação. Foram simplesmente trapalhadas a mais.
Acho que Sampaio fez bem em ter mantido sempre uma certa distância do seu partido de origem enquanto esteve em Belém. O Presidente deve, idealmente, manter-se acima dos partidos sem abdicar por isso de exprimir e assumir posições politicas sobre os assuntos nacionais.
Eu não me identifico com a tradição ideológica do seu partido, mas tenho que admitir que Jorge Sampaio deixou a fasquia bastante alta para o senhor que se segue.
Pois eu, também não concordo.
Acho que Jorge Sampaio foi demasiadamente passivo:
- na saúde.
- no ensino.
- na justiça (e não me refiro apenas ao caso PGR).
- na concertação social.
Independentemente do governo à data (guterres - durão - santana ou sócrates).
Faltou-nos um presidente mais apelativo e interventivo (não é o mesmo que governativo/executivo)..
Terão sido estas algumas razões que sustentaram a eleição de Cavaco Silva.
Penso eu de que...
Não quero dzer que ache que Sampaio não teve o perfil para o lugar ou que tenha sido um (muito) mau Presidente.
Mas foi um Presidente muito 'fofo'!
Caro Miguel Araújo,
O homem foi, é, sem dúvida «fofo». Mas, em parlamentarismo, é assim que tem de ser o chefe de Estado.
Ora, embora não sejamos um sistema parlamentar, o nosso semipresidencialismo permite uma amplitude vasta de desempenhos presidenciais. Mais próximos ou distantes de cada um dois pólos entre os quais esse sistema se move: o parlamentarismo e o presidencialismo. Sampaio escolheu a proximidade parlamentar. É essa e só essa, a perspectiva defendida no «post».
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