🧭 Bonhoeffer e o Conformismo Português: a Estupidez como Virtude Cívica
Em 1943, preso pelos nazis, o teólogo alemão Dietrich Bonhoeffer escreveu um dos textos mais lúcidos do século XX: a sua “teoria da estupidez”. Observando como milhões de cidadãos instruídos haviam aderido cegamente ao regime de Hitler, Bonhoeffer concluiu que a estupidez é mais perigosa do que o mal.
Não por ser falta de inteligência, mas por ser renúncia moral — o momento em que o indivíduo abdica do pensamento próprio para se fundir na multidão.
“O mal pode ser denunciado e combatido;
a estupidez, nunca — pois é surda à razão e imune aos fatos.”
— Dietrich Bonhoeffer, Cartas da Prisão
Bonhoeffer não falava de idiotas, mas de pessoas comuns, cultas e até sensatas, que em determinadas condições se deixam possuir pela coletividade. A estupidez, dizia ele, “é um fenómeno social mais do que psicológico”: surge quando o medo, a esperança ou o conformismo nos libertam da obrigação de pensar por conta própria.
🇵🇹 Conformismo à portuguesa
A história recente de Portugal oferece exemplos eloquentes deste tipo de abdicação coletiva.
O primeiro é o entusiasmo socialista de 1974–75. Mal derrubado o regime de Salazar, o país mergulhou numa euforia revolucionária que parecia ignorar a evidência já clara do fracasso do socialismo real no mundo. Falar em economia de mercado era visto como heresia. As massas queriam acreditar — e acreditaram. Foi menos um erro de análise do que um ato de fé: a esperança substituiu o raciocínio.
Outro exemplo foi o apoio quase místico à independência de Timor-Leste nos anos 1990. A causa timorense transformou-se numa redenção nacional — a “boa consciência” de um país culpado pelo seu passado colonial. Questionar a viabilidade económica ou a manipulação geopolítica da causa era impensável. A unanimidade moral triunfou sobre a reflexão crítica.
Mais recentemente, a vacinação em massa durante a pandemia de Covid-19 tornou-se um teste de obediência social. Quem exprimia dúvidas sobre a eficácia ou a proporcionalidade das medidas era tratado como inimigo público. A confiança na autoridade substituiu o exame dos factos. Portugal, um dos países mais vacinados do mundo, mostrou também como o consenso pode mascarar o medo.
E no plano internacional, o conflito em Gaza voltou a dividir a sociedade portuguesa — como tantas outras — em tribos morais: “os do lado de Israel” e “os do lado da Palestina”. Cada grupo repete os seus mantras, ignora as atrocidades do lado que defende e acusa o outro de desumanidade. A complexidade é abolida; só resta a pureza moral do grupo.
🧠 O mecanismo
O denominador comum destes episódios é sempre o mesmo:
Pressão social e medo do isolamento → a pessoa prefere alinhar do que arriscar o estigma.
Narrativas morais simplificadas → o mundo divide-se entre bons e maus, vítimas e culpados.
Recompensa emocional da pertença → sentir-se parte do “lado certo” é mais confortável do que pensar.
A partir desse momento, já não há diálogo. A estupidez, no sentido bonhoefferiano, é impenetrável à razão. Fatos contrários são simplesmente descartados, e a própria dúvida é tida como traição.
💡 O antídoto
Bonhoeffer não acreditava que a estupidez se curasse com informação ou educação.
Ela só se vence com libertação interior — com coragem moral para pensar e responder por si mesmo.
Em termos modernos, poderíamos chamar-lhe consciência individual resistente à narrativa dominante.
Portugal, país pequeno e historicamente habituado à obediência — ao rei, à Igreja, ao Estado, à Europa — tem dificuldade em valorizar essa resistência. Mas é nela que começa a verdadeira cidadania: a capacidade de dizer “não tenho a certeza” quando todos gritam “é evidente”.
🔚 Conclusão
A teoria da estupidez de Bonhoeffer não é uma acusação: é um espelho.
Mostra-nos que, sempre que a sociedade se organiza em torno de certezas morais inquestionáveis, a inteligência cede lugar à fé social.
E que, em qualquer época — sob Hitler, sob a Revolução dos Cravos, sob a pandemia ou sob as bandeiras de Gaza —, o primeiro dever do cidadão livre é o mesmo:
pensar por si próprio, mesmo quando isso o torna impopular.
PS: Conversa com o ChatGPT
Sem comentários:
Enviar um comentário