O PENSADOR
‹‹O PENSADOR›› não existe na realidade mundana, nunca nos vamos cruzar com um fulano nu, sentado, com a cabeça suportada no punho direito e o braço esquerdo repousado sobre o joelho.
‹‹O PENSADOR›› existe apenas na mente de Rodin, que o esculpiu e retratou. O que nos quereria transmitir o escultor? Certamente algo que reside na matriz cultural do Ocidente e com que nos podemos identificar, dado o universalismo da sua obra.
Para imergir nos memes imbuídos na estátua sentei-me na posição do pensador e deixei fluír os pensamentos e associações livres que surgiram. Pensei em vulnerabilidade, incerteza, foco e proteção.
A inclinação do corpo é sempre uma atitude de resguardo, que procura oferecer a menor superfície possível a um ataque. Revela falta de coragem e de iniciativa e condiciona a fisiologia para a defesa, não para o ataque.
Nessa postura experienciam-se sentimentos de vulnerabilidade e de incerteza. Enroscamo-nos porque nos sentimos vulneráveis, incertos sobre os acontecimentos e portanto necessitados de focar o pensamento.
O nome que Rodin atribuiu a esta sua obra ‹‹O Pensador›› não deixa dúvidas a este propósito: focar a mente, pensar. Imagino que o pensador está tão absorto na sua mente que ignora tudo e todos à sua volta. Não receia portanto ameaças externas, a sua vulnerabilidade é interna, é existencial.
Talvez essa seja a razão mais importante da universalidade e popularidade do pensador, todos sofremos de alguma angústia existencial e precisamos de todos os recursos mentais para a ultrapassar. Pensar em construir a nossa essência, sem a qual ficamos vulneráveis.
A rudeza ou aspereza da estátua, longe dos ideais clássicos de beleza, remete-nos para a própria criação: ‹‹E formou o Senhor Deus o homem do pó da terra, e soprou em suas narinas o fôlego da vida; e o homem foi feito alma vivente›› —
Genesis 2:7.
Feito do pó da terra, do barro, portanto rude, grosseiro, mas também com capacidade para se moldar.
‹‹O PENSADOR›› foi inicialmente projetado para o tímpano (espaço triangular sobre um portal de entrada) de um portal chamado Portas do Inferno e era suposto representar Dante Alighieri contemplando o Inferno, uma das três partes da Divina Comédia.
Rodin destaca, nas Portas do Inferno, o desespero, a aflição e o horror. ‹‹O PENSADOR›› — enquadrado como Dante, reflete sobre estas maldições. É natural que se sinta vulnerável.
Quando sai do tímpano das Portas do Inferno para o âmbito público, ‹‹O PENSADOR›› transporta em si o Inferno.
O Inferno que está em cada um de nós e que só focando o pensamento, só através da razão, lhe podemos escapar. Para mim, este é o meme desta obra maior e intemporal do Rodin.
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