O presidente da República apelou recentemente aos gestores bancários para mostrarem mais solidariedade para com os cidadãos portugueses (cf. aqui). No seu comentário televisivo desta semana, o ex-presidente do PSD, Marques Mendes, fez eco das preocupações do presidente da República. O presidente do Chega foi mais longe e, numa atitude digna do Bloco de Esquerda, convocou os gestores da banca para comparecerem no Parlamento (cf. aqui).
Tudo porque estatísticas recentes relativas à Zona Euro mostram que o diferencial entre as taxas de juro activas (empréstimos) e passivas (depósitos) é maior em Portugal do que a média europeia. Logo surgiram as velhas suspeitas da actuação dos espíritos malignos, segundo as quais os gestores da banca andariam a almoçar frequentemente em conjunto para cartelizar o sector e manter os seus lucros artificialmente elevados, em prejuízo dos portugueses.
Antes de prosseguir, eu gostaria de dizer que existe agora em Portugal uma nova plêiade de economistas - como o presidente da República, o comentador Marques Mendes e o presidente do Chega - que têm em comum o facto de serem todos licenciados em Direito.
Mas isto não é de todo surpreendente. Um dos factos mais salientes do recente escândalo dos abusos sexuais no Centro de Estudo Sociais da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra é o facto de o professor mais reputado da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra não ser um economista, mas um sociólogo, curiosamente também licenciado em Direito. Ainda por cima um sociólogo de extrema esquerda, ilustrando bem o folclore económico que lá se cultiva e se ensina aos estudantes.
Aquilo que todos estes economistas partilham é uma visão da economia portuguesa como se fosse uma quinta, cada um deles colocando-se na posição do capataz.
Numa quinta, todos os preços resultam de decisões pessoais do capataz, que as toma tendo em atenção critérios de justiça relativa. O banqueiro da quinta não pode cobrar muito pelos empréstimos e enriquecer, enquanto os outros empobrecem e se queixam ao capataz. Nessa altura, o capataz apela ao sentimento de solidariedade do banqueiro para que baixe os juros e, se ele não o fizer voluntariamente, o capataz obriga-o a que o faça.
Numa quinta, os preços são o resultado de decisões pessoais do capataz e estão sujeitos a critérios de justiça relativa. É diferente quando se trata, não de uma quinta, mas de um país inserido numa economia globalizada, como Portugal. Aí os preços, incluindo as taxas de juro, são fixados pelo mercado, sendo o resultado das decisões independentes de milhões de pessoas diferentes.
Os preços tornam-se, então, grandezas impessoais que resultam das acções de milhões de pessoas mas em que nenhuma pessoa em particular, ou grupo de pessoas, tem uma acção decisiva na sua determinação. Aos preços de mercado não se aplicam mais os critérios de justiça ou injustiça os quais são aplicáveis apenas aos resultados de acções pessoais.
Enfim, de nada vale apelar aos gestores bancários ou convocá-los para o Parlamento porque não são eles que fixam nem as taxas activas nem as taxas passivas da banca e consequentemente o seu diferencial. É o mercado. E o diferencial é maior em Portugal do que na média europeia não por causa da sua ganância, mas porque o risco da actividade bancária em Portugal é maior do que a média europeia, como mostram as falências de vários bancos no país em anos recentes.
O diferencial das taxas de juro é a margem de comercialização da banca no seu negócio de transacionar dinheiro. Se o risco é maior, as margens de comercialização também têm de ser maiores para compensar para o risco acrescido.
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