26 dezembro 2022

Um juiz da Diocese (30)

(Continuação daqui)


Chiara Lubich: "A política é o amor dos amores" 


30. Os Jesuítas de saias

Para além das semelhanças (cf. aqui), existem diferenças entre os dois juízes que ultimamente tenho vindo a referir neste blogue.

Do ponto de vista intelectual, o juiz Marcolino é um matarruano, obcecado por dinheiro e por posições de importância que possa exibir perante os seus conterrâneos e rivais de Bragança. É o mais básico e previsível dos dois. Pelo contrário, o juiz Patto é um ideólogo comunista e militante, convencido que é santo. É, de longe, o mais insidioso dos dois. Nenhum deles hesitará em corromper a justiça, mas enquanto o juiz Marcolino a corrompe pela ambição do dinheiro, o juiz Patto corrompe-a pela ambição do poder.

É preciso recuar um pouco no tempo para compreender a posição de influência que o juiz Patto conquistou na Igreja Católica Portuguesa. Ele faz parte da direcção da Igreja, na sua condição de presidente da Comissão Nacional Justiça e Paz, um órgão laical da Conferência Episcopal Portuguesa. Ele é juiz diocesano de Lisboa. Ele é membro do Conselho Pastoral de Lisboa. Ele integra lugares em  organizações ligadas à Igreja, como a Associação "O Ninho". Ele é convidado frequente da agência Ecclesia, a agência noticiosa da Igreja, e da Rádio Renascença. Ele está à frente do órgão de propaganda do Movimento dos Focolares em Portugal - a revista Cidade Nova. 

A partir de certa altura so seu pontificado, coincidente com o Concílio Vaticano II, o Papa João XXIII convenceu-se que a capacidade dos padres para expandirem a fé católica estava esgotada ou em vias de se esgotar. Tinham sido dois milénios de muito desgaste, muitas batalhas travadas, algumas vencidas outras perdidas, que tinham deixado a imagem dos padres muito deteriorada junto da opinião pública. Adivinhavam-se já na altura mais crises que abateriam o prestígio dos padres por mais umas décadas - como viria a acontecer com a recente crise de pedofilia na Igreja -, e, entretanto, fogosos movimentos protestantes, sobretudo evangélicos, conquistavam fiéis à Igreja, mesmo em países que tradicionalmente eram grandes bastiões do catolicismo, como era notoriamente o caso do Brasil.

Havia que fazer alguma coisa. E aquilo que o Papa resolveu fazer foi  admitir os movimentos laicais, trazendo para dentro da Igreja, em substituição dos padres, verdadeiros pastores protestante, homens e mulheres, solteiros e casados, que traziam à instituição o vigor do proselitismo protestante, que faltava aos padres católicos. O juiz Patto é hoje o exemplo acabado dessa nova figura na Igreja, do homem que, não sendo padre, parece um padre e age como um padre - uma figura à qual tradicionalmente os portugueses chamavam "padreca", nem é nem deixa de ser, uma imitação, quase sempre uma falsificação, do verdadeiro padre católico.

Trazer o protestantismo para dentro da Igreja era um grande risco, como a experiência histórica dos Jesuítas tinha demonstrado. Desde o seu início, em meados do século XVI, eles representaram o luteranismo protestante dentro da Igreja Católica e só a promessa de obediência ao Papa, frequentemente violada, os tornava católicos. Eles eram excelentes intelectuais, críticos radicais do clero tradicional, ávidos pelo poder e pelo dinheiro, sempre prontos a traficar influências e, frequentemente, mais papistas que o Papa, desrespeitando a vontade do Papa para, segundo eles, melhor servir a vontade do Papa.  

Mas terá sido também a experiência dos Jesuítas que deu esperanças ao Papa acerca desta nova experiência de admitir de novo o protestantismo na Igreja. Depois da revolta de Lutero em que a Igreja perdeu fiéis em massa nos países do norte da Europa, foram os jesuítas, magníficos missionários, que compensaram essa perda, expandindo a fé católica em outras partes do mundo, como a América Latina,  a Ásia e a África.

Um dos movimentos protestantes aprovados pelo Papa João XXIII foi o Movimento dos Focolares ou Obra de Maria (1962). Apropriadamente descrito na Wikipédia como fundamentalista, totalitário e conservador (cf. aqui) surgiu em Itália no pós-Guerra pela mão de Chiara Lubich, uma professora primária de 23 anos, nascida no seio de uma família politicamente de esquerda, o pai era socialista e o irmão comunista (cf. aqui). O lema era unificar a humanidade segundo a prece de Cristo "Pai, que todos sejam um só" (Jo:17:21)

No seu proselitismo protestante, ficou célebre a afirmação de Chiara, ecoada anos depois pelo juiz Patto, de que "A política é o amor dos amores" (cf. aqui). Nesta frase, os Focolares anunciavam ao que vinham, à semelhança dos Jesuítas: fazer política com a religião e religião com a política - e a política seria de esquerda, e ainda mais radicalmente que os Jesuítas. Não se consegue tornar todos um só, a menos que todos se tornem radicalmente iguais. O lema religioso servia perfeitamente os propósitos comunistas do movimento - tornar todos iguais. Política e poder eram o seu desiderato, sempre em nome de Deus. 

Muitas outras semelhanças os Focolares viriam a revelar com os Jesuítas, mas havia também pelo menos uma diferença de monta. Os Jesuítas são um movimento de homens, e eu arriscaria dizer de homens viris, como a sua bravura de missionários deixou claro por esse mundo fora.  Ao passo que os Focolares são um Movimento feminino, também conhecido por Obra de Maria, fundado por uma mulher e que é obrigatoriamente presidido por uma mulher (actualmente,  Margaret Karram ). É por isso que, aos meus olhos, eles representam "Os Jesuítas de saias"


(Continua continua)

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