Aquilo que o André Ventura tem feito - sendo o primeiro líder partidário a trazer Deus para a esfera pública (cf. aqui) -, pode representar um choque para muitos democratas, mas é perfeitamente compatível com a tradição portuguesa. Ora, o CHEGA define-se como um partido conservador e, portanto, um partido defensor das tradições portuguesas.
A democracia é uma criação dos países de influência protestante do centro e norte da Europa, não dos países católicos do sul, como Portugal, Espanha ou Itália, e só muito tardiamente chegou a estes países.
O protestantismo venera apenas Cristo (princípio protestante Solo Christo) e não, como o catolicismo, também os santos e a Virgem Maria. A religiosidade do protestantismo exprime-se através de uma relação privada (íntima) e directa entre o crente e Cristo.
O catolicismo é muito diferente. No catolicismo, a religiosidade do crente exprime-se através de uma relação pública e indirecta com Cristo, e é intermediada pelos santos e pela figura de Maria.
Ao contrário do protestantismo, cujo culto é geralmente privado, o culto do catolicismo é público. As igrejas católicas estão sempre abertas a quem queira lá entrar, nas horas de culto ou outras. Não é o caso das igrejas protestantes, cujo culto é geralmente feito à porta fechada, e que se mantêm fechadas fora das horas de culto.
No catolicismo, o povo organiza festas, romarias, peregrinações, procissões aos santos e à Virgem Maria e todas estas manifestações religiosas são ostensivamente públicas. Nada disto existe no protestantismo.
Em suma, na tradição católica do povo português, a religião é pública e Deus é uma figura pública. Pelo contrário, nos países de tradição protestante onde nasceu a democracia, a religião é privada e privada é também a relação com Deus.
Acresce que nos países de influência protestante do centro e norte da Europa onde nasceu a democracia, as divisões religiosas que se seguiram ao movimento da Reforma do século XVI deram lugar a guerras religiosas (v.g. Guerra dos Trinta Anos) onde morreram milhões de pessoas. Nesses países, trazer Deus para o espaço público é criar divisões entre as pessoas e, às vezes, ódios de morte - divisões e ódios renovados mais recentemente pela imigração islâmica nesses países.
Nada disto aconteceu em Portugal, um país que é esmagadoramente católico. Os portugueses não se dividem pela religião. Em Portugal, a religião é uma instituição de unidade, não de divisão.
Ao trazer Deus a público, o André Ventura está a exprimir uma das maiores tradições portuguesas - a religião como factor de unidade nacional, e Deus como figura pública.
Portugal não é a Alemanha, nem a Suíça, nem a Suécia, nem a Inglaterra, nem os EUA.
Portugal é católico.
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