(Continuação daqui)
(Política/Limites do Estado)
28. O Princípio da subsidiariedade como referência
Uma comunidade de ordem superior não deve, por princípio, interferir na vida interna duma comunidade de ordem inferior, substituindo-se a ela e privando-a da sua autorresponsablidade e competências, mas deve antes encorajá-la e apoiá-la em caso de necessidade, e ajudá-la a coordenar a sua ação com a de outras componentes sociais, com vista ao bem comum. A subsidiariedade significa a edificação do sistema político, do sistema social e do sistema económico de baixo para cima, da Sociedade para o Estado. A nível administrativo, a consequência é a subsidiariedade da freguesia em relação à família, do concelho em relação à freguesia, do distrito em relação ao concelho, das organizações do Estado em relação às da Sociedade. O poder tutelar do Estado fica limitado pelo dever de busca permanente de legitimação na vida quotidiana dos cidadãos, e pelo dever de coesão do território nacional. O CHEGA reconhece o papel fundamental do Estado em áreas vitais da Sociedade, nomeadamente enquanto funções sociais indispensáveis nas áreas da saúde e do ensino, mas rejeita qualquer forma de substituição e dependência, ambas causadoras de uma crónica destruição do tecido social.
O liberalismo estava perfeitamente afirmado no final do século XVIII depois de Adam Smith ter publicado em 1776 o seu clássico do liberalismo económico "A Riqueza das Nações" e ter dado início a uma nova ciência social - a Economia. Adam Smith era presbiteriano, uma corrente do calvinismo, e calvinistas eram também a maioria dos fundadores do país que na altura estava a nascer e que em dois séculos se tornaria o mais poderoso do mundo e o paradigma do liberalismo económico ou capitalismo - os EUA.
Somente em meados do século XIX viria a nascer o socialismo, com a publicação do Manifesto do Partido Comunista (1848), o qual em breve se desdobraria em várias correntes como o comunismo e a social-democracia ou socialismo democrático. O socialismo é uma ideologia essencialmente luterana e os principais autores do socialismo - começando com o seu precursor Immanuel Kant -, passando por Hegel e Marx, bem como pelos fundadores da social-democracia, August Bebel ou Ferdinand Lassalle, vêm todos da muito luterana Prússia.
Só muito tardiamente, os países de tradição católica ou latina reagiram a esta oposição entre o liberalismo anglo-saxónico (calvinista) e o socialismo germânico (luterano). A primeira reacção organizada ocorreu em 1891 com a publicação da Encíclica Rerum Novarum do Papa Leão XIII que procurou posicionar-se na disputa entre capitalismo e socialismo.
Como não podia deixar de ser, a Rerum Novarum rejeitou quer o capitalismo quer o socialismo pois ambas as ideologias derivavam das duas maiores correntes teológicas de oposição à Igreja - o calvinismo e o luteranismo. O Papa Leão XIII prometeu uma terceira via entre o capitalismo e o socialismo, mas muitos observadores nas décadas seguintes acabariam por desesperar porque a Igreja nunca mais a tornava explícita.
Porém, alguma coisa foi produzida, embora só quatro décadas depois. Um dos principais factores de divisão entre o capitalismo e o socialismo era o papel do Estado. O liberalismo defendia o Estado-mínimo, cingido às suas funções de soberania. O socialismo, pelo contrário, defendia um Estado muito interventivo na área social, que viria a ficar conhecido por Estado-providência ou Estado-social.
Por essa altura, o Estado socialista ou Estado-providência já era uma realidade na Prússia, onde foi criado por Bismarck. Nas sua política de kulturkampf que, na prática, consistiu em expulsar a Igreja Católica e eliminar da Prússia tudo o que fosse católico, Bismarck defrontou-se com um problema - era a Igreja Católica que assegurava os serviços de ensino, saúde e assistência aos velhos e necessitados. Expulsando a Igreja Católica, ele precisava de uma instituição que a substituísse nestas funções, hoje conhecidas como funções sociais. Foi assim que nasceu o Estado-social ou Estado-providência.
Foi o Papa Pio XI que, em 1931, na Encíclica Quadragesimo Anno, destinada a marcar o quadragésimo ano sobre a publicação da Rerum Novarum, lançou as bases da concepção do Estado que é própria da cultura católica, por oposição ao Estado-mínimo do calvinismo ou ao Estado-providência do luteranismo. Foi no momento em que formulou aquele que é hoje conhecido como o princípio da subsidiariedade, ao escrever:
"Verdade é, e a história o demonstra abundantemente, que, devido à mudança de condições, só as grandes sociedades podem hoje levar a efeito o que antes podiam até mesmo as pequenas; permanece, contudo, imutável aquele solene princípio da filosofia social: assim como é injusto subtrair aos indivíduos o que eles podem efetuar com a própria iniciativa e capacidade, para o confiar à coletividade, do mesmo modo passar para uma sociedade maior e mais elevada o que sociedades menores e inferiores podiam conseguir, é uma injustiça, um grave dano e perturbação da boa ordem social. O fim natural da sociedade e da sua ação é subsidiar os seus membros, não destruí-los nem absorvê-los".
A concepção do Estado-subsidiário, segundo a qual o Estado fará tudo aquilo que a sociedade não faça mas que precisa de ser feito, é uma concepção flexível do Estado, e não uma receita fixa como o Estado-mínimo ou o Estado-providência. Tanto pode ser um Estado muito grande como um Estado muito pequeno dependendo das circunstâncias (v.g., guerra ou paz, crise social ou ausência dela) e da cultura do povo ao qual se aplica. Em condições normais, o Estado-subsidiário será um Estado pequeno num povo com grande sentido de iniciativa, e um Estado maior num outro falho de iniciativa.
O CHEGA defende o Estado-subsidiário em todas as esferas da vida em sociedade (v.g., política, social, económica, cultural), que é a concepção do Estado própria da cultura (católica) dos portugueses, por oposição ao Estado-mínimo do liberalismo anglo-saxónico e ao omnipresente e todo-poderoso Estado providência do socialismo luterano.
Nas últimas décadas é esta última concepção do Estado que tem vigorado em Portugal, com os resultado conhecidos - como a ausência de crescimento económico, a corrupção generalizada, os níveis record de tributação, etc.
(Continua)
Sem comentários:
Enviar um comentário