I. Na gaveta
Dois dos casos mais paradigmáticos da corrupção da justiça que tenho referido neste blogue envolvem polícias de um lado (agentes da PSP, num caso, cabos da GNR no outro), juízes do outro lado e, naturalmente, advogados. Em ambos os casos, os prevaricadores são juízes. Em ambos os casos, são os polícias que, no cumprimento da sua missão, acabam condenados pelos tribunais.
Um caso foi contado numa grande entrevista ao i pelo advogado João Nabais e revela a cultura de desvergonha e crueldade que vigora no meio judicial. Vale a pena relembrar o essencial (cf. aqui).
O advogado João Nabais, que se vê a si próprio como um Don Juan das juízas, uma noite foi beber uns copos com uma juíza, que ele identifica por Conceição, ao Bar Texas, no Cais de Sodré. À saída, altas horas da madrugada, quem se encontrava bêbado era o polícia que estava de serviço cá fora, que se envolveu numa altercação verbal com ele.
Acabou tudo na esquadra da Bica onde habitualmente acabam a noite muitas das prostitutas da zona acompanhadas dos respectivos clientes, elas reclamando por falta de pagamento, eles que o serviço não foi bem prestado. Perante o chefe da esquadra, o advogado Nabais ainda se conseguiu identificar como advogado, mas a juíza Conceição apenas proclamava ser juíza, mas não tinha o cartão.
Ora, naquela esquadra, o polícia de serviço devia estar habituado a que todas as prostitutas que lá caem rotineiramente, ainda por cima toldadas pelo álcool, proclamem ser rainhas de Inglaterra, e tratou o casal em consonância, algemando-os para evitar mais desacatos.
Dias depois, o advogado Nabais e a juíza Conceição puseram um processo-crime ao polícia. Mexendo os cordelinhos dentro do sistema de justiça, conseguiram que o homem fosse condenado a três anos de prisão efectiva. O polícia não conseguiu aguentar a injustiça e suicidou-se.
O outro é o célebre caso dos guardas da GNR. Em 2012 o juiz Neto de Moura conduzia um carro sem matrícula em Loures. Foi parado e multado por uma brigada da GNR. O juiz terá puxado do seu cartão de juiz para ameaçar os guardas, e estes queixaram-se ao Comando. O Comando fez queixa ao Conselho Superior da Magistratura que não puniu o juiz. O juiz aproveitou esta circunstância para apresentar uma queixa-crime contra os guardas por denúncia caluniosa.
Em primeira instância, os guardas foram absolvidos. O juiz Neto de Moura recorreu para a Relação de Lisboa - hoje conhecida por fazer favores a juízes - que condenou os guardas numa pena de multa e a pagarem uma indemnização ao juiz.
Ainda não se sabe, se à semelhança do caso anterior, este caso vai acabar em suicídio de algum dos guardas. Eles são quatro e a sentença de condenação ainda não transitou em julgado, embora tenham passado dez anos sobre o momento em que os guardas cometeram o crime sobre o juiz.
A razão é que o processo ainda não está fechado. Está no Tribunal Constitucional há dois anos, o último ano e meio à espera que o Plenário deste Tribunal se pronuncie sobre ele. Na linguagem corrente, parece que o Tribunal Constitucional decidiu meter este processo na gaveta.
Por que será?
(Continua)
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