II. Por causa do racismo
Os inquisidores ganharam este nome porque antigamente iam por aí pelas aldeias, vilas e cidades do país, a inquirir quais eram os cidadãos que não se portavam bem, que não eram bons cristãos. Normalmente, escolhiam como alvo os cristãos-novos - isto é, os judeus convertidos - por duas razões fáceis de compreender.
A primeira é a de que era fácil dizer dos cristãos novos que eram falsos cristãos, que se tinham convertido ao catolicismo, mas que isso era só aparência conveniente porque, na realidade, continuavam a seguir as práticas e os preceitos da religião judaica.
A segunda é mais importante. Os cristãos-novos eram geralmente homens de negócios, homens endinheirados - os novos-ricos da época - a quem os inquisidores confiscavam a riqueza para depois ficarem com ela.
Hoje, os modernos inquisidores são diferentes, não na questão do confisco da riqueza, mas na maneira como chegam aos seus alvos. Se antes tinham de se deslocar pelo país fora, hoje ficam confortavelmente resfestelados nos seus gabinetes do Ministério Público à espera que as vítimas lhes cheguem pelos jornais e pelas televisões.
Dão-se mesmo ao luxo de desprezar outros meios de comunicação social como aqueles que estão associados às novas tecnologias da internet. A tal ponto que corria o ano de 2007, os blogues estavam no auge da sua popularidade, e o inquisidor-mor permitiu-se desvalorizar os blogues. "Os blogues é uma vergonha", disse ele sem arrependimento e com toda a correcção sintática (cf. aqui).
Foi, por isso, através dos jornais - na realidade, através de um grande trabalho do jornal Público - que, em 2014, praticamente dez anos após ter andado a fazer milagres em Valongo, que S. Branquinho caiu nas mãos dos inquisidores.
Iniciou-se então uma minuciosa investigação acerca dos milagres de S. Branquinho e, mais ainda, das suas contas bancárias - que é aquilo que a Inquisição mais gosta de investigar - e que culminou este verão, seis anos volvidos, num despacho acusatório.
Vale a pena citar de novo o jornal Público:
"Na acusação do Departamento de Investigação e Acção Penal Regional do Porto, assinada pelos procuradores Nuno Serdoura e Ana Margarida Santos, estes pedem aos dez arguidos acusados e à PMV o pagamento ao Estado de 2,3 milhões de euros, o montante que o MP considera ser a vantagem dos crimes" (cf. aqui, ênfase meu)
Antigamente, e durante certo período da nossa História, este dinheiro acabava todo nos bolsos dos inquisidores. Agora, não sei bem como é - se é todo ou só uma parte. Ninguém imagina as discussões que antigamente ocorriam entre a Coroa e a Inquisição (isto é, entre o Estado e a Igreja) para decidir quem é que ficava com a maior fatia do bolo.
O ponto importante, porém, é que é agora, quase vinte anos depois, que os tribunais vão apurar se S. Branquinho é, na realidade, um santo, e se faz ou não milagres. Perguntar-se-á por que é que o Ministério Público demorou tanto tempo a investigar S. Branquinho e os seus milagres - mais tempo, na realidade, do que a própria Igreja Católica hoje em dia demora a fazer um santo.
Foi por causa do racismo.
Os inquisidores do Ministério Público, que sob a aparência da justiça fazem mas é política, passaram os três últimos anos a discutir se deviam acusar criminalmente um santo com o nome de Branquinho. Acabaram por concluir que sim. Com o nome de Pretinho é que teria sido politicamente incorrecto.
(Continua)
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