É a terceira vez que digo que faço amanhã 65 anos. É para não me darem os parabéns.
Também faz amanhã 64 anos que fui baptizado pela Igreja Católica. Não me deram liberdade de escolha. Ainda bem, porque hoje, com quase 65 anos, eu não saberia escolher uma religião ou cultura (conheço uma razoavelmente bem, duas assim-assim e muito pouco acerca de todas as outras).
Maldigo quem escolheu por mim? Não, pelo contrário. São muitos os benefícios de se nascer numa cultura católica, mesmo para quem não é especialmente religioso - eu diria até, sobretudo para esses.
O baptismo tem muitos significados, e um dos principais é o da admissão do novo ser humano numa comunidade (é este o significado original da palavra igreja): "A partir de agora és dos nossos, nunca te deixaremos ir ao fundo". É uma mensagem muito reconfortante para quem, como é normal, irá encontrar muitas situações agrestes na vida. Na cultura católica, mesmo nas situações mais adversas da vida, há sempre alguém que nos põe a mão por baixo.
Deixando de lado o aspecto religioso, qual é a mensagem de vida que a doutrina católica transmite? A seguinte, que resumo na sigla TCE: "Podes fazer Tudo na vida, desde que o faças nas Circunstâncias adequadas e com Equilíbrio".
Diria mesmo que Equilíbrio é a palavra-chave do Catolicismo. Sendo uma doutrina de tudo e o seu contrário, porque tudo e o seu contrário são criações de Deus, é uma doutrina que permite todos os extremos, e o segredo está precisamente em encontrar o Equilíbrio entre eles.
Na cultura católica encontram-se as pessoas mais radicais acerca de qualquer aspecto da vida, de um lado e do outro do espectro. Mas também se encontram as mais equilibradas. Nesta cultura, encontramos o homem mais religioso do mundo e o maior ateu, o mais honesto e o maior aldrabão, o melhor jogador de futebol e o mais azelha a jogar à bola. A maior parte das pessoas, porém, tende para o equilíbrio entre os extremos.
Sendo uma cultura comunitária à escala universal - é esse precisamente o significado da palavra católico -, que visa fazer conviver pessoas das mais diversas origens (europeus e asiáticos, índios e africanos, etc.) e de todos os credos, é uma cultura que não exclui ninguém.
É uma cultura aberta a todos e possui, por isso, um sistema moral que é imensamente flexível ("Deves-te comportar de tal e tal maneira mas, se não o fizeres, também não é por isso que te vamos excluir"). Daí a sua necessidade de uma classe cuja função é a de relembrar constantemente as regras.
O catolicismo é muito mais do que uma cultura de liberdade. É uma cultura de permissividade. Aquilo que não se puder fazer ou desfrutar num país de cultura católica, por certo que não se consegue fazer ou desfrutar em mais lado nenhum do mundo.
É uma cultura personalista. Cada um pode ser diferente dos outros, e é encorajado a ser diferente dos outros. Por isso, é na cultura católica que encontramos as pessoas mais interessantes que se podem conhecer na vida. Como é, porém, uma cultura de tudo, e que inclui os extremos, também é aí que encontramos as mais desinteressantes de todas.
É também uma cultura onde o modo de ser feminino prevalece sobre o modo de ser masculino. Em nenhuma outra cultura que eu conheça, a mulher tem tanto predomínio e influência social como na cultura católica. Ao homem é largamente reservado o papel de servir a mulher e o seu rebanho (e é disso que os padres dão exemplo, servindo a Igreja, que é teologicamente a figura de Maria).
A figura da Mãe é a figura proeminente da cultura católica, embora o Deus seja o Filho. Por isso, é uma cultura onde o homem é imensamente mimado pela mulher, e tudo começa pela sua própria mãe.
Não é nada mau nascer numa cultura assim. É uma cultura onde cada um pode ser o que quiser.
1 comentário:
muito interessante essa ideia do equilíbrio porque ainda hoje andei com ela, a propósito da noção de gravidade- da Ciência e de tudo o resto, bem antes da Ciência.
A gravidade é o peso que impede a expansão do universo ou o seu desaparecimento por força de contracção oposta.
E é todo o meio-termo em tudo. A harmonia na essência das coisas. Tentei até encontrar alguma questão em que não estivesse presente e tivesse sido formulada desde os tempos mais antigos e não encontrei.
Pode começar pela Religião católica e seguir para a´ética platónica ou aristotélica ou antes disso na mitologia com a medida com regra e siga à vontade da economia, à medicina que ela está lá.
Sem esse equilíbrio maleável nada progredia ou tudo se perdia por excesso ou defeito e desaparecia até um nada.
Os prot não sabem isto. Retiraram Maria, retiraram o perdão. Dizem que é tudo livre para ser culpado e esperam mais o armagedão que o Paraíso- o tal que até na terra sempre foi o eixo do mundo.
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