27 novembro 2017

Vento

Na ponderação entre o direito à liberdade de expressão e o direito à honra, a jurisprudência do TEDH atribui uma grande importância ao direito à liberdade de expressão e muito pouca ao direito à honra (menos ainda tratando-se de políticos ou outras figuras públicas).

Considerando um total de 10 pontos-importância a distribuir pelos dois direitos, a jurisprudência actual faz prevalecer o direito à liberdade de expressão sobre o direito à honra por uma margem que é da ordem dos 9-1.

E qual é a tendência?

A tendência é para se caminhar para 10-0 (e não para 8-2 ou 7-3), isto é, para descriminalizar as chamadas ofensas à honra e acabar, pura e simplesmente, com o crime de difamação.

Numa resolução de 2007 a Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa (de que faz parte o TEDH) recomenda aos Estados-membros que descriminalizem a difamação (aqui) e aponta as razões (parágrafos 7 e 8): o crime de difamação serve frequentemente como instrumento de intimidação e perseguição pessoal e política e é um entrave à liberdade de expressão, que é um valor essencial de uma sociedade democrática.

Muitos Estados já o fizeram mas é compreensível que Portugal, dada a ausência de uma tradição democrática, esteja atrasado. No fim de contas, acabar com o crime de difamação é acabar com um valioso instrumento através do qual, ao longo da nossa história, nós fizemos uma das coisas que melhor sabemos fazer: acabar com os dissidentes.

Descriminalizando a difamação, acaba-se com o direito à honra. Onde quer que se encontre, Shakespeare poderá finalmente voltar a escrever, mas desta vez com propriedade:

"O que é a honra?
Uma palavra.
O que há nessa palavra honra?
Vento."


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