12 março 2009

não discute


No meu post anterior afirmei que o homem que pretenda ser elite num país de tradição católica aprende a sabedoria junto do povo. É nesta sua relação com o povo que gostaria agora de elaborar.

Em primeiro lugar para reiterar que devido ao seu liberalismo e tolerância extrema, o homem ou a mulher do povo aceitam tudo, e o seu contrário, dentro de limites muito amplos, como o limite da não-violência. Por isso, os homens e as mulheres do povo são imensamente sabedores, para além de extraordinariamente curiosos. Existe, por isso, no povo português muita sabedoria, é nele que estão praticamente todas as respostas possíveis a uma mesma questão, é com ele que se aprendem as "mil maneiras de cozinhar bacalhau". Aquilo que lhe falta é julgamento, isto é, capacidade para decidir qual é a melhor ou a verdadeira maneira de cozinhar bacalhau entre as mil que ele conhece.

Estes traços da sua cultura católica conferem ao homem do povo uma postura peculiar na vida. Por um lado, perante qualquer problema da vida, ele tem uma solução. Por outro lado, ele não está certo que a sua solução seja a boa ou a verdadeira solução. Desta insegurança acerca de possuir a boa ou verdadeira solução derivam duas características de carácter do homem do povo português - a sua humildade e a sua radical teimosia. Se ele não reconhece a si próprio possuir a verdade, ele também não reconhece a qualquer outro homem do povo que a possua. Quando estas duas "verdades" se encontram o choque é inevitável e ele acaba sempre a preferir a sua à do outro.

Por isso, a maneira de o homem que pretende ser elite se relacionar com o povo deve ser uma maneira humilde e em que ele pergunta ao homem do povo: "Como é que se faz isto...?", "O que é que o senhor pensa daquilo...?", "Como é que o senhor faria no meu lugar se lhe acontecesse isto ou aquilo...?". O homem que pretende ser elite vai junto do povo para aprender e, por isso, deve manter a postura do aluno. O aluno faz perguntas e ouve as respostas do professor. O aluno não comenta as respostas do professor, e sobretudo não oferece respostas alternativas. Se o fizer, o confronto é inevitável, dada a teimosia radical do homem português. Numa palavra, o aluno não discute com o professor, o que no caso quer dizer que um homem que pretenda ser elite não discute com o povo. Ele ouve o povo.

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