05 setembro 2008

back to basics

Quando Ronald Reagan ganhou, pela primeira vez, as eleições presidenciais norte-americanas, a guerra-fria vivia o seu mais delicado momento. Reagan chegou à Casa Branca com 70 anos de idade e as críticas que lhe moveram, antes e imediatamente depois desse instante, eram arrasadoras: velho, boçal, militarista, inculto, moralista e fanático religioso, sem preparação para enfrentar a complexidade do mundo em que vivia, insensato e, seguramente, o Anjo do Apocalipse de uma iminente guerra nuclear na qual ele nos lançaria a todos. Em contrapartida, a intelligentsia da época acenava com a sensatez, o equilíbrio, a moderação e com os quatro anos de paz sacrificada que Jimmy Carter, o abnegado plantador de amendoins da Geórgia, garantira à América e ao Mundo.

Reagan utilizou sempre uma elementar clareza para explicar ao que vinha. Um dos seus slogans de campanha era, aliás, uma formulação sintética notável sobre os seus princípios: «Back to basics». Tratava-se, no fim de contas, de propor ao país o regresso aos valores fundacionais e fundamentais que o tinham feito grande: uma concepção moral do serviço público, a distinção clara entre o justo e o injusto, o certo e o errado, o bem e o mal, livre-iniciativa, economia de mercado, governo reduzido, responsabilidade individual e a recuperação do estatuto de grande potência internacional, que a Guerra do Vietname abalara profundamente. Os valores conservadores da América estavam todos lá: Reagan foi contra a liberalização do aborto, defendia a família, falava em valores morais (lembram-se da «Moral Majority»?), invocava Deus a todo o momento e pedia a sua protecção para o país de que era Presidente. Em economia e na concepção do estado e da relação deste com os cidadãos, era assumidamente liberal. Na política internacional, Ronald Reagan não podia ter sido mais claro: obedecendo aos princípios clássicos da política, traçou uma linha no chão e dividiu o Mundo entre «nós» e «eles», o Mundo Livre e o Império Soviético, ao qual chamou, utilizando categorias que não cabem preferencialmente no espaço da política, o «Império do Mal».

Não pode deixar de espantar a similitude das críticas hoje movidas a John MacCain, com aquelas que foram, naquele outro tempo, endossadas a Ronald Reagan. Também MacCain é «velho», «militarista», «religioso fanático» e «incapaz» de governar a América e lidar com a complexidade do Mundo em que vive. Para mais, num Mundo em que o perigo terá sido criado por ela, à semelhança do que sucedera no Vietname. A lógica é exactamente igual: os republicanos provocaram a queda da América lançando-a numa guerra insensata, logo, não podem ser os republicanos a reparar o mal feito.

E o que diz a isto o agora candidato republicano? Apenas o que disse, há vinte e sete anos, Ronald Reagan: que a América tem de regressar aos seus valores primordiais, que precisa de acreditar nos seus cidadãos, de lhes dar responsabilidade, liberdade, menos governo, menos impostos e mais mercado. No fim de contas, do que a América precisa é de «back to basics», como o candidato não deixou de enfatizar no discurso que encerrou, ontem, a Convenção Republicana. Foi isto que os Republicanos conseguiram, nos seus melhores momentos, dar à América, e que os Democratas não quiseram nunca dar-lhe, nem mesmo nos seus momentos melhores.

E em política internacional, numa altura em que o Mundo volta a estar perigoso pelo ressurgimento dos velhos antagonistas de Moscovo e de muitos outros avulsos, MacCain explicou com clareza que as relações internacionais não são domínio próprio para a retórica dos bons sentimentos e das estratégias enviesadas. Elas carecem de clareza, determinação e de força. Porque, se não nos quisermos prolongar muito na história, temos sempre à mão as actuais ditas guerras do Médio Oriente onde intervêm os Estados Unidos. É bom não esquecer que, antes delas, as Torres Gémeas não caíram por acaso, naquele fatídico dia de 11 de Setembro de 2001.

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