31 dezembro 2021

democratas descartáveis

O juiz Manuel Soares, presidente da Associação Sindical dos Juízes Portugueses (vulgo, Sindicato dos Juízes) dá hoje uma grande entrevista ao DN, que é o tema de capa (cf. aqui). O juiz Manuel Soares parece saber perfeitamente que a justiça é o grande cancro da democracia portuguesa.

Não é por acaso que a popularidade dos militares começa a ascender de novo na democracia portuguesa, na pessoa do Almirante Gouveia e Melo, como já antes aconteceu no Brasil - que herdou a tradição judicial portuguesa -, na pessoa de Jair Bolsonaro e pela mesma razão - a perda de confiança dos cidadãos na justiça.

É que, quando os cidadãos perdem a confiança na justiça, só lhes resta a confiança numa outra instituição para assegurar a justiça e a paz social - a instituição militar.

O juiz Manuel Soares parece pressentir de tal maneira o perigo que ele próprio começa a jogar o jogo do passa-culpas, atribuindo a crise da justiça aos políticos. Chega ao ponto de afirmar que "Há democratas descartáveis", a afirmação bombástica que dá o título à entrevista.

Curiosamente, um dos democratas descartáveis é ele próprio, no sentido que vou explicar a seguir.

A Constituição afirma que a justiça está ao serviço do povo e é exercida em nome do povo, mas a verdade é que, por inércia do povo, a justiça foi capturada pelas três principais corporações que a dominam - juízes, magistrados do Ministério Público e advogados.

Os principais atributos de um sistema de justiça democrático são a independência (em relação ao poder político) e a imparcialidade (a qual decorre da independência) do poder judicial. 

Ora, a existência de um Sindicato dos Juízes é a prova factual de que os juízes reconhecem ter um patrão - que é o poder político -, em relação ao qual é função do Sindicato exigir melhores condições salariais e outras para os seus membros.

O Sindicato dos Juízes é a prova acabada de que os juízes reconhecem ter um patrão, que é o poder político. Os juízes não se podem queixar depois - como faz o juiz Manuel Soares - que o patrão queira mandar neles e que queira mandar no sistema de justiça. Todo o patrão quer mandar.

Por isso, para  instituir uma justiça verdadeiramente democrática no país - uma justiça independente do poder político -, o primeiro passo é descartar o Sindicato dos Juízes. E, por implicação, descartar o seu presidente Manuel Soares.  

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