13 outubro 2019

Corrupção

                                                                   

Não é assunto grave, nem certamente servirá para dividir os seus aderentes, mas se a Iniciativa Liberal é inovadora a reclamar uma taxa de 15%  de IRS para todos, o mesmo já não se poderá dizer quando se trata da corrupção.

Uma Comissão Parlamentar não tem nada de novo (cf. aqui). E também não vai resolver nada.

A corrupção em Portugal tem muito de gambuzino, todos falam sobre ela, todos até já a viram, mas no momento de a apanhar ninguém sabe muito bem onde ela está e o que ela é.

No índice da Transparency International Portugal nem sequer está mal classificado. De acordo com esse Índice é o 30% país menos corrupto do mundo (cf. aqui). E eu próprio tenho a convicção de que a corrupção não é grande em Portugal e aquela que existe não é sobretudo do tipo de que mais se fala (alguém ser pago para fazer aquilo que não deve).

É certo que o tamanho do Estado é o primeiro factor gerador de corrupção e nos últimos 50 anos, o Estado aumentou muito, praticamente triplicou de tamanho. Em 1968, à morte de Salazar, o Estado pesava 16% no PIB e, em 1974, quando o regime do Estado Novo caiu, pesava 20%. Agora, pesa quase 50%. O potencial para a corrupção aumentou significativamente.

Também existe corrupção no sector privado. A dificuldade para o empregado corrupto numa empresa privada é que o patrão anda lá por perto a saber o que os empregados fazem ao seu dinheiro e o que fazem durante o tempo de trabalho que ele lhes paga, em particular as companhias com que se metem e as aventuras em que se envolvem.

No caso dos funcionários públicos, o patrão - que são todos os contribuintes -  não está lá, e eles são deixados praticamente em roda livre.

Assente que a corrupção, a existir, está mais no Estado e menos no sector privado, dá-se o primeiro passo para localizar e identificar o fenómeno da corrupção.

O segundo passo vem da resposta à pergunta: E em que sector do Estado?

Numa sociedade democrática como a nossa, o Estado está dividido em três sectores, que correspondem aos três poderes democráticos - o executivo, o legislativo e o judicial.

 O poder executivo abrange os diferentes níveis de governo (central e autarquias locais) e a administração pública. O poder legislativo está concentrado na Assembleia da República. O poder judicial inclui instituições como o Ministério Público, a Advocacia e a Judicatura.

A corrupção é um crime que se pratica às escondidas e, portanto, longe dos olhares públicos. A resposta à segunda pergunta - Em que sector do Estado haverá mais corrupção? - depende, portanto, do escrutínio público a que estão sujeitos os agentes do Estado pertencentes a cada um dos três poderes democráticos, e o consequente grau de transparência que eles exibem.

É muito difícil hoje em dia em Portugal, com o escrutínio cerrado por parte da comunicação social e das redes sociais, a que estão sujeitos os agentes dos poderes executivo e legislativo (governantes, administradores públicos e deputados) emergir alguma grande rede de corrupção nestas duas esferas do Estado.

Pelo contrário, o poder judicial só muito recentemente, e de forma muito tímida, começou a ser sujeito ao escrutínio público. Os cidadãos têm medo de o fazer e os políticos também. Durante a última campanha eleitoral só um político - Rui Rio - fez uma crítica ao poder judicial e ainda assim indirecta. Era uma crítica ao Ministério Público quando disse que não queria viver num país onde as pessoas acordavam de manhã com a sua vida arruinada pelas parangonas dos jornais que se vendiam nas tabacarias.

Frequentemente, os portugueses falam de corrupção e exigem que a Justiça actue de forma determinada para acabar com ela. Mas o que fazer, quando se chega à conclusão que a corrupção, a existir, está em primeiro lugar no próprio sistema de Justiça?

Bem, neste caso, o que a Iniciativa Liberal devia propor é uma Comissão Parlamentar, não para combater a Corrupção, mas para a reforma da Justiça.

A esta Comissão deveria merecer particular atenção o Ministério Público e as grandes sociedades de advogados.

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