09 junho 2018

o perfume

O réu está sob escrutínio, na realidade ele é a pessoa que num julgamento está sob escrutínio directo e imediato.

O juiz também. O juiz tem de fundamentar a sua sentença que está sujeita a escrutínio por parte dos seus superiores - os juízes da Relação e do Supremo.

Só há um tipo de pessoas presentes no julgamento que não está sujeito a qualquer tipo de escrutínio. São os advogados, e isto inclui quer os advogados privados quer os advogados do Estado (magistrados do MP).

Gozam de imunidade e de perfeita impunidade. Podem mentir, difamar, caluniar, fazer afirmações sem fundamento, confundir,  insinuar, combinar depoimentos, podem fazer tudo que nada lhes acontece.

Só não podem depreciar-se mutuamente, por exemplo, chamarem mentirosos uns aos outros porque isso dá processo na Ordem dos Advogados. O "respeito" com que se tratam parece ser a condição para o mal que, com perfeita liberdade, podem fazer a todos os outros que participam no julgamento - o réu, as testemunhas, o próprio juiz.

O juiz está ali para fazer justiça e a justiça exige, em primeiro lugar, o apuramento da verdade. Mas quando aos advogados é dada inteira liberdade para mentir, eles passam a ser opositores à justiça, na realidade os principais inimigos da justiça e do juiz.

Pela experiência que tive, os nossos tribunais são o reino dos advogados, um reino onde eles têm total impunidade e perfeita liberdade para fazer o mal - excepto para fazer o mal a eles próprios.

A vítima e o réu deixaram de se poder confrontar em tribunal e passaram a figuras de segundo plano no julgamento. Um e outro têm obrigatoriamente de ser representados por advogados, o réu por um advogado privado, a vítima por um advogado público (magistrado do MP). O julgamento passou a ser um palco quase exclusivamente reservado a advogados e um palco onde eles podem praticar toda a espécie de artimanhas.

A emoção própria do homem a quem roubaram a carteira é substituída por um discurso sereno, às vezes burocrático, legalista, aparentemente racional e profissional, sob cujo manto se podem cometer as maiores barbaridades, ao ponto de se poder tornar claro que são agora os próprios advogados que querem roubar a carteira ao réu.

São os advogados que puseram o povo fora dos tribunais e que mais temem pelo seu regresso. O povo que, perante uma mentira descarada, exclamaria um

-Ohhh....

que faria eco na sala de audiências.

O povo que chegaria cá fora e comentaria:

-Mas o que é que o carro do réu tem que ver com isto?... E a empresa dele?... E a casa onde ele vive?...E as viagens que faz?...Será que eles querem deitar a mão àquilo que o réu tem?...

e a reputação dos advogados cairia em proporção, bem como a sua liberdade para fazer o mal.

No meu julgamento, foi o Portugal Contemporâneo que levou o perfume do povo para dentro da sala de audiências.

E foi isso que fez os advogados entrar em paranóia.

1 comentário:

Anónimo disse...

imagine que isto torna-se tendência...