03 maio 2018

França




A França é um país excecional? E se sim, qual é a origem da excecionalidade francesa? Fiquei a pensar nestas perguntas depois de ler um texto da Camille Paglia, intelectual norte-americana, crítica de arte e feminista, afirmando que a França e o Japão são os dois únicos países do mundo fundados sobre um conceito de beleza. É possível um país estar fundado sobre um conceito de beleza? Perguntei-me de imediato. Uma resposta positiva a esta questão certamente que garantiria a distinção de excecionalidade à França.

Conceitos como nacionalidade, soberania, liberdade ou direitos cívicos têm constituídos os pilares fundacionais da maior parte dos países. Poderá a beleza ter um estatuto equivalente?

Neste post procurarei demonstrar que, de facto, a beleza pode ser um conceito fundacional, que a França parece fundar-se na “beleza”, que a compreensão deste fenómeno é essencial para o planeamento estratégico público e privado e ainda para ficarmos alerta para riscos inerentes.

O primeiro passo desta demonstração é naturalmente definir o que é a beleza. Sem pretender entrar em polémicas filosóficas, proponho a seguinte definição:

‹‹A BELEZA é a qualidade de um estímulo interno ou externo (ex. Pintura ou Pensamento) que provoca um sentimento de valorização da própria vida››.

Trata-se de uma definição suficientemente genérica para englobar conceitos objetivos e subjetivos de beleza, ainda com a vantagem de ser validado pela sua própria falsificação, uma vez que a desvalorização da vida retiraria qualquer significado cultural ou civilizacional à beleza.

Ora sendo inequívoco que a beleza está associada à valorização da vida, podemos dar um segundo passo que é equiparar a prossecução da beleza ao reconhecimento de um direito universal que é o direito à vida, este sim já com um estatuto de caráter fundacional e constitucional na maior parte dos países.

Por fim a conclusão teórica: É possível fundar um país sobre o conceito de beleza, na mesma medida em que é possível fundar um país sobre o direito sagrado à vida (com os corolários daí decorrentes: direitos de liberdade, propriedade e busca da felicidade). Esta evocação da Declaração de Independência dos EUA, país irmão da França, permite uma reflexão sobre a beleza intrínseca deste documento e sobre o papel da beleza no pensamento político.

Sendo então admissível, em termos teóricos, que um país assente as suas fundações num conceito de beleza, pergunto-me, a França está fundada na Beleza?

Para responder a esta pergunta utilizarei dois argumentos, a importância das atividades diretamente relacionadas com a beleza em França e o enfoque de alguns princípios fundacionais da república francesa na beleza.

Relativamente ao primeiro ponto, a importância das atividades diretamente relacionadas com a beleza, julgo que bastará destacar que a França é considerada, desde há séculos, como “o berço da beleza e do luxo” e que é líder global na exportação destes produtos. A L'Oreal, só para dar um exemplo, lidera o mercado, com vendas de 18 B€. A Shiseido, japonesa, ocupa o segundo lugar, com vendas de 6 B€.

No segundo ponto, o enfoque da política na beleza, vou apenas referir-me a dois elementos. O mote oficial da França: ‹‹liberdade, igualdade e fraternidade›› e a Marianne, a figura feminina alegórica da república francesa.

Há beleza no mote oficial da França, ‹‹liberdade, igualdade e fraternidade››. Quando ouvimos estas palavras sentimos que a vida está a ser valorizada e que vale a pena viver, livres para buscar a felicidade, iguais em termos de direitos e de responsabilidades e com fraternidade, esse elemento que distingue a civilização da barbárie.

Há beleza também na Marianne, ícone revolucionário da república francesa, inspirado na deusa romana Libertas. E não esquecendo a famosa Estátua da Liberdade (Liberty Enlightning the World) do Frédéric A. Bartholdi.

Liberdade que é um conceito político fundacional do Ocidente e de que a França é um importante bastião. Bastião que transporta no próprio nome, em latim: Francia – o Reino dos Francos, os que são livres porque não têm de pagar tributo aos romanos.

Liberdade, o conceito mais belo que a mente humana pode conceber porque é o que mais valoriza a vida. Pelo contrário, a escravatura e a prisão desvalorizam a vida ao ponto de não valer a pena ser vivida.

Na minha opinião, a beleza enquanto possível conceito fundacional da França emerge de forma espontânea num “território favorecido pelos deuses” e onde os cidadãos foram e têm sido livres para buscar a sua felicidade. Quem é livre busca a beleza e elege-a como valor supremo, porque procurar a beleza é defender a vida.

Ao nascer num hexágono, desenhado pelo próprio Zeus e inspirado por Libertas, os franceses descobriram o potencial da beleza e exportaram-no para o mundo. Quem chega a Nova Iorque e vê a “Liberdade a Iluminar o Mundo”, só pode dizer: obrigado França.

Os franceses, porém, que eram “francos” por estarem livres de pagar tributo a Roma, são, hoje em dia e cada vez mais, escravos do próprio Estado francês com o seu regime fiscal confiscatório. Ora esta perda de liberdade é feia e, a médio prazo, ameaça todas as atividades orientadas pela beleza.

Infelizmente, esta trajetória já se iniciou e a França está a perder mercado, a nível global, para países que continuam a dar mais valor à liberdade.

É necessário que a “Belle France” continue a desejar ser Bela, para continuar a ser excecional.

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