06 setembro 2014

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Há semanas, num post neste blogue, o Joaquim lançou a toalha ao tapete. Não sem algum desalento, concluiu que Portugal não é um país liberal (no sentido do liberalismo anglo-saxónico).

De facto, não é, embora existam liberais em Portugal (em Portugal há de tudo), como ele. Mas o liberalismo não é dominante na cultura portuguesa.

E devia ser?

Não sei. Durante muito tempo eu (tal como o Joaquim) pensei que sim até concluir que isso só me punha contra Portugal e os portugueses, que são as pessoas que fizeram de mim aquilo que eu sou - eu a achar que os portugueses deviam ser liberais e os portugueses a não serem liberais.

Milhões de portugueses que viveram antes de mim fizeram de Portugal um país que não é liberal, e agora vinha eu - um filho tardio, nascido em meados do século XX - chamar-lhes nomes e depreciá-los por eles não serem aquilo que eu gostaria que fossem, liberais...

Não é uma atitude racional. Racional é aceitar Portugal e os portugueses tal como eles são. Em matéria de liberdades eu penso que eles são muito mais do que liberais. São permissivos. Em Portugal pode-se fazer tudo.

Não existe dimensão da liberdade mais ampla do que esta.

2 comentários:

Vivendi disse...


sábado, 6 de Setembro de 2014

Sempre actual
País do nosso (des)governo


POR CRISTINA ESTEVES (aquela que costuma aturar os politiqueiros)

Regressei a casa, ao trabalho. Após um período de férias, recortado por afazeres profissionais, que nos tempos que correm ser ininterrupto e sempre em família já é em si mesmo um luxo, e repartido entre o Sul e o Norte, do Algarve às Beiras.

Nada particularmente diferente de outros anos, em que se concilia a época balnear com a preservação das raízes familiares que também faço por transmitir aos meus.

Talvez tenha passeado mais, fruto do tempo pouco veranil e de um mar que pleiteou com os baldes de água gélida que marcaram a nossa 'silly season'.

Realmente vi mais. Vi com outros olhos. Vi além da necessidade imediata de uma auto-estrada Norte-Sul de três faixas em que é preciso fazer um esforço ocular para tentar ver outras vivalmas.

Vi a inutilidade de uma grande avenida frente-atlântica de duas faixas em que foram precisos largos minutos para se conseguir contar pelos dedos da mão as viaturas que circulavam em plena época balnear, excepção feita a um sonoro cortejo momentâneo liderado a preceito pelos noivos, montados a cavalo.

Vi a soberba em rotundas, ou as chamadas "bolachas" como se um deleite se tratasse, de monumentos "feitos a martelo", de piscinas, parques infantis e complexos desportivos faustosos em cada freguesia ou bairro. Vi o desprezível em floreados e rococós em obras públicas e equipamentos sociais, mas pouco económicos, que serviram para idolatrar e reeleger sua excelência o presidente de qualquer coisinha enquanto os cofres públicos eram depurados, entre ajustes directos e concursos públicos ajustados a interesses particulares, partidários ou locais, sempre em nome da causa pública e coesão nacional.
Vi as estações e comboios fantasma de uma empresa tecnicamente falida mas que um mero bilhete custa mais de 50%, ou quase o dobro, da camioneta da rodoviária, caso se opte pela classe turística ou, dizem eles, conforto.

Vi de tudo um pouco. Vi a cada canto a dívida de décadas de descomedimento que absorve o nosso país, até no desprezo a que alguns desses elefantes brancos estão agora dotados, como só se tivessem feito contas até às suas pomposas inaugurações, negligenciando custos de funcionamento ou até de conservação e manutenção.
Agora só falta mesmo ver um novo homem providencial que unilateral e ideologicamente se arrogue de dotar ao abandono o que foi feito, bem ou mal, como de brasões de um outro império se tratassem. Porque o esquecimento é para muitos a única arma de quem não respeita no tempo as nossas tradições, valores e herança cultural, de quem não compreende que também é sobre a memória de um passado pardo que se constrói o futuro.

Vivendi disse...

A reter...

"Porque o esquecimento é para muitos a única arma de quem não respeita no tempo as nossas tradições, valores e herança cultural, de quem não compreende que também é sobre a memória de um passado pardo que se constrói o futuro."