23 abril 2014

Ter filhos, a má ideia que prevalecerá (2)

No blog Pais de Quatro, divaga João Miguel Tavares:


A paternidade, felizmente, tem muitos momentos de prazer, mas até certa idade, se eu me puser a fazer as contas, o saldo é francamente negativo. Agora que eu estou a maior parte do tempo fechado em casa a ler e a escrever, posso garantir-vos que me divirto muito mais das nove às 18 horas e das 22 horas à meia-noite do que das sete às nove e das 18 às 22. Estou com eles, em média, seis horas por dia (excepto aos fins-de-semana, claro), e as nove em que não estou com eles são muito mais calmas, repousadas e self-fulfilling.  

Eu sou, de facto, um pai de quatro criançofóbico, e metade do tempo que passo a falar da família é para alertar para os perigos da paternidade cor-de-rosa - é por tanta gente achar que isto é suposto ser divertidíssimo que tantas famílias vão ao fundo quando os filhos saltam cá para fora e as rotinas mais stressantes tomam conta de nós. Daí a importância da tal educação para o desprazer.

Por favor, não confundam este "desprazer" com a tradicional cultura católica do "sacrifício". O sacrifício, dito de forma bruta, lembra-me sempre gente que coloca o cilício numa perna para se mortificar, e a sua prática cai muitas vezes no lado oposto ao que aqui me quero colocar - uma espécie de recalcamento do "eu" que só serve para causar frustrações e não dá proveito a ninguém, incluindo ao próprio. Não é a isso que me refiro.

O "desprazer" de que aqui falo não é subir para a cruz por vontade própria - é aprender a aceitá-la quando ela vem ter connosco, sem sermos esmagados pelo seu peso. De forma mais filosófica, é a gestão prática da moral do dever kantiana. Ou, se quiserem, é a encarnação do belo provérbio português que diz: "o que tem de ser tem muita força".

2 comentários:

Anónimo disse...

É o amor. É o amor pelos filhos.
.
Não se coloca o amor ao lado dos 'desprazeres' para fazer balanço, qual activo e passivo da felicidade.
.
O amor não é activo, embora os desprazeres possam ser passivo e os prazeres activo.
.
A situação liquida pode ser favoravel ou desfavoravel consoante o caso individual.
.
Agora, tirando isto tudo, que faz parte das coisas da vida, há o amor. Por mais negativa ou insolvente que seja a situação liquida, há o amor.
.
E (quase) toda a gente, incluindo os adultos sem filhos, já sentiram o que é o amor paternal. Tambem já foram filhos.
.
Agora, porque é que, se toda a gente já foi filho e sentiu o amor dos pais resolve não ter filhos, essa explicação eu não a sei dar.
.
Talvez o sistema operativo tenha sido desprogramado ou formatado do exterior. Onde estava escrito nos genes que um gajo tinha que arranjar uma gaja que amasse e fazer filhos - o corolário da relação -, foi apagado e substituido por outro código qualquer.
.
Eu creio que o novo software que corre nos dias de hoje tem a ver com formatação do sistema operativo genético, via redes wireless, em massa, com origem nos mais variados interesses. Economicos, religiosos. modas, propaganda, ideologia etc.
.
Rb

Anónimo disse...

Tal como já postei no post original. Isto fez-me lembrar uma parte do texto de Christopher Alexander do livro Pattern of Language:

Therefore:
Give the house three distinct parts: a realm for parents, a realm for the children, and a
common area. Conceive these three realms as roughly similar in size, with the commons
the largest.
Many small households, not large enough to have a full fledged nursery, not rich
enough to have a nanny, find themselves swamped by the children. The children naturally
want to be where the adults are; their parents don't have the heart, or the energy, to keep
them out of special areas; so finally the whole house has the character of a children's room
- children's clothes, drawings, boots and shoes, tricycles, toy trucks, and disarray.
Yet, obviously few parents feel happy to give up the calm and cleanliness and quiet of
the adult world in every square inch of their homes. To help achieve a balance, a house for
a small family needs three distinct areas: a couple's realm, reserved for the adults; a
children's realm, where children's needs hold sway; and a common area, between the two,
connected to them both.
The couple's realm should be more than a room, although rooms are a part of it. It is
territory which sustains them as two adults, a couple - not father and mother. Other parts of
their lives are involved with children, friends, work; there must be a place which becomes
naturally an expression of them as adults, alone. The children come in and out of this
territory, but when they are there, they are clearly in the, adults' world. See COUPLE'S
REALM (136).
The children's world must also be looked upon as territory that they share, as children,
CHILDREN'S REALM (137); here, it is important to establish that this is a part of the house,
in balance with the others. Again, the critical feature is not that adults are "excluded" but
that, when they are in this world, they are in children's territory.
The common area contains those functions that the children and the adults share:
eating together, sitting together, games, perhaps bathing, gardening - again, whatever
captures their needs for shared territory. Quite likely, the common territory will be larger
than the two other parts of the house.
Finally, realize that this pattern is different from the way
most small family homes are made today. For example, a
popular current conception, comparable to this, but quite
different, is a suburban two part house: sleeping and
commons.


Tiago