Segundo
o historiador A. Pimental (citado aqui),
ainda antes de ser reconhecida a independência de Portugal, D. Afonso Henriques
consagrou o seu novo Reino à Virgem Maria: «Desejando
agora de ter também por advogada diante de Deus a Bem-aventurada Virgem, de
consentimento de meus vassalos, os quais por seu esforço sem ajuda nem socorro
estranho me colocaram no trono real, ordeno que eu, meu reino, minha gente,
meus sucessores fiquemos debaixo da tutela e proteção, defensão e amparo da
Bem-aventurada Virgem Maria... Portanto, a vós Virgem Mãe do meu Senhor Jesus
Cristo..., eu, humildemente servo vosso, D. Afonso, rei de Portugal, vos peço
que defendais meu reino dos Mouros, inimigos da Cruz de vosso Filho e
conserveis minha coroa livre de sujeição estranha e corroboreis no trono real fiéis
servos da minha geração.».
Esta
tradição foi seguida ao longo dos séculos pelos seus sucessores que fizeram
Portugal à imagem de Maria. E foi D. João IV, a seguir à restauração, que
definitivamente consagrou, de maneira oficial,
Nossa Senhora
da Conceição como padroeira de Portugal. Mas não apenas isso. A partir de então inovou-se a
tradição de uma maneira que durou até ao fim da monarquia em 1910, e segundo
a qual os reis portugueses deixavam de ostentar a coroa na cabeça.
O
sinal transmitido por esta inovação era claro, e dava novo vigor à tradição
iniciada por D. Afonso Henriques. A rainha de Portugal, o símbolo da Nação, é
uma rainha eterna, e é uma figura de mulher. O rei, tirando a coroa, põe-se ao
serviço dessa mulher, que ao mesmo tempo representa toda a comunidade ou o povo
português.
Uma
mulher no centro da comunidade e
representando toda comunidade, e um homem, investido de poder absoluto, ao seu
serviço. A função deste homem, dentro de casa, é proteger a comunidade contra
ataques externos e prevenir desordens internas; fora de casa, compete-lhe
ordenar as coisas por forma a assegurar
o sustento da comunidade.
Quem
já tenha governado uma família reconhece aqui o modelo típico de governação da
família portuguesa. É este também o modelo tradicional de governação de Portugal.
Aquilo
que as ideias da modernidade, que tiveram origem no protestantismo religioso
do século XVI vieram fazer foi, em primeiro lugar, dividir a família em
seitas ou partidos, apeando também a mulher do lugar central que ela ocupava na
família. O exercício da governação passou a ser um exercício muito difícil,
senão mesmo impossível – passou a ser o exercício de governar uma família desavinda, uma
família dividida em seitas ou partidos.
Não
existe comunidade sem mulher. Sem a intervenção da mulher nem o pai sabe se é
pai do filho nem o filho sabe se é filho do pai. É necessária a intermediação da
mulher para dar certezas a ambos e unir pai e filho, e daí a centralidade da
mulher na comunidade.
A mulher ao centro, representando o povo e a comunidade, e um homem a servir a mulher. É este o modelo de governação tradicional de Portugal e ao qual vamos ter de voltar se queremos sair do imbróglio institucional em que presentemente nos encontramos.
(Excertos do meu artigo desta semana a publicar no jornal Vida Económica)
1 comentário:
Isso deve ser mesmo tentativa para ser eleito o FROUXO do século (pelo menos).
"O homem a servir a mulher". A mais completa assunção de inferioridade de género. Eu é que não compro essa, como se as mulheres fossem mais do que eu e não seres humanos tal como eu.
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