17 outubro 2013

o caminho para Deus

Se o amor romântico entre o casal não amorteceu ainda, ele vai amortecer a partir do dia em que nasce o primeiro filho. Passa para segundo plano para dar primazia a um novo amor que é o mais forte de todos os amores - o amor maternal, em primeiro lugar, o amor paternal em segundo.

Se até aqui, na fase do amor romântico, o homem e a mulher viviam um para o outro, face a face, olhos nos olhos, nariz a nariz e lábios nos lábios, a partir de agora a atitude deles muda radicalmente, passam a estar ombro com ombro, de mãos dadas ou de braço dado, a olharem ambos na mesma direcção convergente, os rostos quase paralelos, e os olhos, e os narizes e os lábios também.

A fase do face-a-face cede o lugar à fase das mãos dadas. O amor romântico cede a primazia a outro amor mais forte, passa a assumir um papel secundário, fica só para quando puder ser - e as oportunidades vão agora diminuir radicalmente.

Acabou-se a fase dos abraços e dos beijinhos e do sexo a qualquer hora. Ninguém consegue imaginar um casal com três filhos fechado no quarto a rebolar-se na cama, enquanto, cá fora,  um dos filhos põe a cabeça no congelador do frigorífico, outro põe o braço dentro do forno da cozinha e o terceiro se debruça à janela de um quinto andar.

É verdadeiramente esta fase das mãos-dadas que é a fase marcante do casamento e é também a mais longa. É a fase da aliança - que é o próprio símbolo do casamento - em que os esposos se prometem entreajudar para fazer crescer aquela criança que nasceu e  torná-la um homem ou uma mulher. É agora, propriamente, que se  inicia "a longa caminhada de mãos dadas", que foi como eu descrevi, noutra ocasião,  um casamento bem sucedido.

É esta fase, que é a principal do casamento, que é hoje particularmente desvalorizada - e é vista assim pelos próprios jovens que ponderam casar para, frequentemente, e em vista dela, desistirem da ideia. É altura, então, de perguntar, o que é que caracteriza esta fase do casamento, o que é que há nela de especial, se é que há alguma coisa.

Eu preferia responder a esta questão retomando a minha descrição do casamento como "uma longa caminhada de mãos dadas", e perguntando: mas que caminho é que os esposos estão a percorrer, que caminho é esse, esse caminho tem algum fim especial?

A minha resposta vai surpreendê-lo, mas é a resposta verdadeira.

Os esposos estão a percorrer o caminho para Deus, o caminho ao encontro de Deus.

E tendo encontrado Deus pelo caminho, no final das suas vidas podem, desejavelmente ainda de mãos dadas, apresentar-se perante Deus e dizer a uma só voz: "Cá estamos de volta. Acabámos o nosso trabalho, cumprimos a nossa missão".

5 comentários:

Anónimo disse...

"Acabou-se a fase (...) do sexo a qualquer hora. Ninguém consegue imaginar um casal com três filhos fechado no quarto a rebolar-se na cama, enquanto, cá fora, um dos filhos põe a cabeça no congelador do frigorífico, outro põe o braço dentro do forno da cozinha e o terceiro se debruça à janela de um quinto andar."

Imaginar até imagino...
Mas tal como no post anterior fico angustiado.
Com a falta de sorte que nos últimos tempos tenho tido imagino ainda mais: no meio da embrulhada a sogra a tocar-me à campainha!

Recordo-me de Kant dizer, algures, que o casamento é simplesmente a legalização do direito à posse do órgão sexual do parceiro.
Concordo que não é uma visão muito católica da instituição; é apenas uma visão "técnica" do assunto.
Mas restringindo a matéria a esses mesmos termos técnicos considero-a brilhante e perfeita.

D. Costa


Anónimo disse...

Fizemos o que devíamos. Somos servos inúteis.
Amen

Pedro Sá disse...

Er...por essa lógica o caminho inicia-se desde que nascemos e independentemente do percurso.

Anónimo disse...

Felizmente só tenho dois filhos e não vivo no quinto andar... e os filhos que tenho são uns amores que nunca meteram nada na boca que não deviam (comer é à mesa), nunca estragaram nada e na verdade são perfeitos... continua o sexo a toda a hora... somos uns verdadeiros animais...
Na animalidade está a salvação de muito casamento!... já imaginou caro PA?... Se 75% o põem assim, imagine 90% ou mais! -- JRF

Anónimo disse...

Está a parecer-me que é também nessa fase que um ou outro e eventualmente os dois do simpático casal idealizado, começam a costurar para fora... fartos de andar de mãos dadas... -- JRF