12 outubro 2013

falso

Recentemente estive em Kirkcaldy, na Escócia, a terra onde nasceu o Adam Smith e também na Universidade de Glasgow, onde ele foi professor. Foi uma oportunidade para reflectir sobre o sentido da sua obra e o seu legado.

O Adam Smith procurou estudar, teorizar sobre, e promover uma sociedade onde cada pessoa era guiada pelo seu interesse próprio. Aquilo que me ocorreu na altura foi precisamente questionar este pressuposto de base - o de que cada pessoa  era guiada na vida pelo seu interesse próprio.

E comecei por mim: será que na minha vida adulta, os meus comportamentos, as minhas acções e as minhas decisões foram predominantemente guiadas pelos meu interesse próprio?

A resposta a que cheguei foi a seguinte. Muitas poucas, talvez 10 a 15% do total.

É provável que, quem me olhasse de fora, ao longo da minha vida adulta, a desenvolver uma carreira profissional, a procurar um emprego, a negociar um salário, a estabelecer preços para os serviços que prestava, dissesse, como provavelmente diria o Adam Smith: "Olhem, lá anda ele a prosseguir o seu interesse próprio".

Mas isso era pura aparência, mera superficialidade. Porque a verdade, é que a esmagadora maioria do dinheiro que eu ganhei ao longo da minha vida adulta, eu entregava-o, no final do mês, à minha mulher para que ela pudesse governar a família, uma prática que ainda hoje mantenho, e que vai durar até morrer.

Aquilo que eu andei a fazer ao longo de toda a minha vida adulta, e ainda hoje faço,  só numa muito pequena parte foi prosseguir o meu interesse próprio. Aquilo que eu andei a fazer na esmagadora maioria da minha vida adulta foi servir a minha família, a minha comunidade mais próxima

Depois, olhando para o lado, perguntei-me: e os outros homens, no  presente e no passado, têm ou terão tido uma vida muito diferente da minha? Não têm nem tiveram porque se a tivessem ou a tivessem tido nós hoje não estaríamos aqui. Mais ainda no caso das mulheres.

O pressuposto em que se funda a teoria do Adam Smith só contém uma ponta de verdade. Como pressuposto geral aplicável à humanidade é falso. O que esperar então de uma teoria fundada num pressuposto assim?

Esta teoria aplica-se a homens como o Adam Smith ou o David Hume, que morreram solteiros e sem filhos. Mas eles são excepções.  Se todos os homens fossem como eles é certíssimo que nenhum de nós hoje estaria aqui. Felizmente, a maioria dos homens (e das mulheres) não eram, nem são, como eles.

2 comentários:

Anónimo disse...

Milton Friedman chegou a falar sobre isso num debate com jovens comunistas sobre a "justiça das heranças" que segundo as pessoas de extrema esquerda não deveria haver.

Milton Friedman defendeu que ao contrario do que se diz, não somos uma sociedade feita de indivíduos mas sim uma sociedade familiar, logo essa ideia de não ser possível transferir herança é ridícula porque o que nos move são os laços familiares.

Cumprimentos
Ricardo Alves

José Lopes da Silva disse...

O pressuposto de que estes filósofos não criaram e mantiveram uma família é óbvio e já foi aqui debatido antes. Em todo o caso, é preciso colocar uma questão: até que ponto se pode confundir o interesse "próprio" com o interesse da família? Afinal, um pai de família que procura emprego, negoceia salários ou estabelece preços obedece à mesma lei de oferta e procura que um indivíduo solteiro. A diferença estará no output.