02 outubro 2013

A liberdade de escolha

Eu gostaria de dedicar este post ao CN. As questões que ele tem aqui levantado são questões relativas à liberdade de escolha - v.g., tem um pai a liberdade de escolher abandonar um filho; tem uma mulher a liberdade de escolher fazer um aborto?

É sobre a liberdade de escolha que eu gostaria de falar. A liberdade de escolha é um tema caro aos economistas de pendor liberal, e parte daquela liberdade que, depois do 25 de Abril, é talvez o valor mais invocado em público em Portugal.

A minha questão não é a de saber se nós apreciamos a liberdade de escolha ou não. Em geral, apreciamos. Quem não aprecia poder escolher entre dez cores diferentes de guardanapos na prateleira do supermercado, ou entre vários modelos de automóveis num stand?

A minha questão é anterior a esta e, no meu conhecimento, nunca foi posta por um economista liberal, seja o von Mises, o Rothbard, o Hayek ou o Friedman, para menciona os principais - este último sendo mesmo o autor de um livro famoso com o título "A Liberdade de Escolher". Eles partem do pressuposto, sem nunca o questionar, que as pessoas, em geral, sabem escolher. É um acto de fé admirável em homens que são tomados por racionalistas.

A minha questão é a seguinte: Mas sabem as pessoas escolher?

Antecipando a resposta, eu estou cada vez mais inclinado a pensar que, em relação à grande maioria,  a resposta é um conclusivo Não.

Não vou discutir, obviamente, a escolha de guardanapos, ou mesmo de automóveis. São escolhas sem importância e das quais, em caso de má escolha, resultam consequências menores.

Vou discutir uma escolha que é importante na vida das pessoas, uma escolha que, no caso de ser uma má escolha, afecta decisivamente a vida das pessoas, não apenas dos próprios que a tomaram, mas também de terceiros, quase sempre indefesos. Refiro-me à escolha do cônjuge.

Desde o 25 de Abril, a liberdade de escolher o cônjuge é total, incluindo para as mulheres que, antes, estavam de certo modo condicionadas a fazer essa escolha sob a influência da comunidade, designadamente da família. Hoje, é difícil encontrar uma pessoa que case coagida e que não faça uso da sua plena liberdade de escolha nesta matéria.

Não apenas isso. Trata-se de uma escolha para a qual cada pessoa possui todo o tempo que quiser para a ponderar e ter em atenção todos os factores relevantes. Inclusivamente, antes de casar, já conviveu, por vezes, em regime de união, com a pessoa que vem a escolher como cônjuge. Trata-se de uma escolha em relação à qual os economistas diriam que é feita, ou pode ser feita, com informação completa, senão mesmo perfeita.

Tratando-se de uma escolha tão importante, e podendo ela ser tomada com informação plena, o que é que se pode dizer das escolhas que os portugueses fazem do cônjuge? Que na sua esmagadora maioria não sabem escolher. Cerca de 75% dos casamentos feitos em Portugal terminam em divórcio. (cf. aqui. Esta é a estatística mais chocante que eu vi sobre Portugal nos últimos anos - três quartos dos casamentos em Portugal acabam em divórcio). Não apenas isso. Não só a grande maioria dos portugueses não sabe escolher o cônjuge como, a julgar pela tendência, cada vez sabe menos.

Mas se os portugueses, na sua grande maioria,  não sabem escolher o cônjuge, que razão temos nós para acreditar que eles sabem escolher um partido político, uma ideologia política,  um programa de governo ou o homem que irá governar a sua terra nos próximos quatro anos?

De que vale a liberdade de escolha, se a grande maioria das pessoas não sabe escolher? Para fazer asneiras?

A liberdade de escolha arruinou a instituição da família em Portugal, que é a primeira e a mais importante de todas as comunidades. Arruinar a comunidade não deve ser uma consequência surpreendente da liberdade de escolha, que é uma liberdade protestante. Aquilo que o protestantismo sempre fez, em todos os lugares e em todas as épocas, foi destruir, ou tentar destruir, comunidades - e a primeira foi, obviamente, a Igreja Católica.

A palavra Economia vem do grego e foi pela primeira vez utilizada por Aristóteles, significando "governo da casa", portanto, estando associada ao sentido moderno de economia doméstica ou economia familiar. Mas se os portugueses, na sua grande maioria, não são capazes de manter e governar uma família, o que é que se pode esperar acerca da sua capacidade para governar o país - isto é, da democracia?

16 comentários:

zazie disse...

ehehehe

Casar com quem se quer, em Portugal, é fenómeno com menos de 40 anos.

Como diria o José do Portaloja- mais uma tirada à Rosas&Pereira.

marina disse...

pois , e sem um ninho seguro e estável dificilmente a cegonha aumentará a produtividade .

Michael disse...

Liberdade deescolha pressupõe liberdade para errar e aprender ou não com esses erro. A evolução da sociedade faz-se com erros e aprendizagem. Diria que mais vale errar do que não ter liberdade para o fazer.

Anónimo disse...

Hehe... Zazie o PA tem um funil por onde cabe toda e qualquer tese...
E sobre os 25% de casados digo-lhe mais caro PA... na minha comunidade os divórcios são, tendo em conta esses números, raros... mas a maior parte dos casais, vá lá 75% dos tais 25%, está junta por a) questões económicas e práticas; b) inércia (mais verdade quanto mais velhos e longa a relação); c) não faço a mínima ideia porquê, porque visto daqui são pessoas que não só não se entendem como não têm nada em comum, de onde fico perplexo como se juntaram à partida...
O número de divórcios não é exclusivo de Portugal... o Ocidente nem a célula básica da sociedade consegue manter, mais que a cair de maduro, está podre... manifesta-se em tudo. -- JRF

Vivendi disse...

A realidade dos números (e da vida) superam sempre qualquer verborreia.

É por esta e por outras que eu gosto de tirar o chapéu ao PA.

zazie disse...

Sim, a longa noite do facismo durou mais de 400 anos.

Pedro Sá disse...

Está a partir de um princípio completamente errado. De que uma relação só funciona quando dura até à morte.

Pelo contrário, como diz alguém, o amor é eterno enquanto dura. Algo acabar significa apenas e só que esse relacionamento funcionou até essa altura, a não ser que uma ou ambas as partes continuem a enganar-se a si próprias.

Acresce que o seu raciocínio é altamente anglo-saxónicos...é exactamente igual à lógica de muitos norteamericanos, desde logo, em não aceitar como candidato seja ao que for uma pessoa divorciada.

Pedro Sá disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Luís Lavoura disse...

Há que ver que a liberdade de escolher é, frequentemente, perversa.
Colocado perante uma ampla liberdade de escolher entre imensos produtos, o cérebro humano fica confuso, não sabe que critério utilizar na escolha, e acaba por ou não escolher, ou escolher mal.
Devido a este efeito, é vantajoso, em muitos casos, restringir deliberadamente a liberdade de escolha, por exemplo eliminando boa parte das alternativas.

muja disse...

Claro Lavoura.

Os autoritários são maus porque não deixam escolher, mas já vocês, excelentes democratas, declarando o meu cérebro confuso e ignorante, determinam que o melhor é limitar-me a escolha. O que, na práctica, é pouco diferente de escolher por mim. E a isso chamam, democracia.

E a liberdade de escolher é que é perversa... Não são os tipos que, em nome dessa mesma liberdade, a diminuem... ahaha!

zazie disse...

Mas faz todo o sentido sermos nós a restringirmos as escolhas.

Escolher é mesmo isso- colocar de parte uma data de coisas em que nem se vai pensar e ir fechando o leque.

zazie disse...

Olha, por isso é que esta mania recente de vender a ideia de "sucesso" a todos os jovens é tremendamente nefasta.

Metem-lhes na cabeça que todos podem ser vedetas- que não existem limites para fama e sucesso (à Big Brother) e depois eles nem sabem o que escolher dentro das suas capacidades.

josé maria martins (dótôri) disse...

Tamêm áxo!

Anónimo disse...

as pessoas hoje casam-se menos, mas principalmente a demografia tem uma piramide demografica invertida.
O simples facto da demografia ter uma piramide demografica invertida faz que o calculo:
(nº de divorcio deste ano)/(nº de casamentos deste ano)
seja enganador.
Porque se está a meter nas contas divorcios de casamentos com 20 anos, quando o nº de casamentos, até pelo tamanho das gerações, era muito maior, e comparando com o nº de casamento recentes.
Este calculo até podia dar resultado acima dos 100%.
Nota - também há divorcios falsos, feitos por razões economicas, nomeadamente fuga ao fisco.

ocni

Anónimo disse...

O último anónimo referiu um aspecto muito importante nesta estatística. Atenção às conclusões temerárias.

André disse...

Não acho nada pertinente este argumento.

1) Tanto o casamento como as eleições não são verdadeiras escolhas livres e abertas. Em ambos os casos impõem-nos uma lista de candidatos sem termos a possibilidade de fazermos “misturas” ou escolhas “fora do circuito” habitual.

2) Não é por se escolher uma coisa hoje e amanhã queremos outra, por X ou Y razão, que isto faz de nós uns inaptos. De tal forma, insistir sempre na mesma formula não significa que somos mais capazes. Aliás quando a formula falha sistematicamente é o sinal que somos idiotas ao continuar por esse caminho.

3) A verdadeira questão que levanta este argumento é de saber se podemos, devemos establecer um momento em somos capazes de fazer escolhas. Atendendo à estupidez das 3 últimas gerações de governantes políticos portugueses, à quantidade de maiores de 50 anos que neste país andam a afirmar que o despesismo é a melhor coisa para a Nação na sua íntegra, e em contraponto ver jovens de 12 anos a cometerem actos de adulto repreensíveis sem uma onça de remorso, por vezes orgulho, vemos bem que em Portugal (no mundo em geral) muita gente deveria ser tratado ainda como criança e outros assumirem responsabilidades mais cedo.