11 fevereiro 2013

anomia

Eu gostaria de voltar a este post e ao artigo que aí citei para desenvolver um tema - o da relação entre o laicado e o clero no âmbito do catolicismo.
 
Ao celebrar a vida laica de Cristo, ao promover em cada cristão no exercício da sua vida diária - na família, no trabalho, nas actividades cívicas - a encarnação do próprio Cristo, aquilo que o Opus Dei está a promover é a igualdade de estatuto entre o laicado  e o clero.
 
Para os países do catolicismo tradicional, como Portugal,  esta é uma ideia absolutamente revolucionária. E é também uma ideia que, a ganhar raízes, permitiria um dia aos portugueses terem uma cultura verdadeiramente democrática - algo que eles não têm.
 
No catolicismo tradicional existe uma subordinação do laicado ao clero. Eu bem posso estudar as Escrituras e perante uma audiência de portugueses ter uma discussão acerca delas com um padre. Mas por maior que seja o meu conhecimento e as minhas capacidades persuasivas, no final a audiência dará razão ao padre. Porquê? Porque ele é padre.
 
Já se vê como esta característica do catolicismo tradicional desencorajou toda a actividade espiritual e intelectual autónoma. De que me vale a mim procurar participar activamente na vida da Igreja e na discussão da sua doutrina se, no fim do dia, a minha palavra não vale nada, e serão os padres a decidir?
 
Séculos desta cultura transportaram esta atitude para a vida cívica. De que me vale a mim - pensa o cidadão comum - ter uma participação cívica activa nos assuntos da sociedade se, no final do dia, a minha palavra não conta nada, e são os políticos a decidir?

Daqui resulta a anomia da opinião pública que torna inviável a democracia. Sobre um qualquer assunto da vida pública, cada um não tem uma opinião formada e fundamentada que esteja pronto a defender, a lutar por ela e, no limite, a dar a vida por ela. Não. Cada um diz aquilo que lhe vem à cabeça e, naturalmente, não tem, ele próprio, a mínima confiança naquilo que lhe vem à cabeça. Daí o recurso à imitação do estrangeiro, e às ideias importadas do estrangeiro, para governar o país.
 
O Opus Dei não pretende a abolição do clero, como fizeram os calvinistas, e portanto ele respeita a tradição da Igreja. Mas, pela santificação da vida corrente, pretende levantar o laicado para o nível do clero no exemplo e na prática do cristianismo, colocando ambos os grupos ombro a ombro na propagação e no exemplo da fé cristã. De uma relação de subordinação do laicado ao clero, passa-se para uma relação de igualdade entre os dois grupos.
 
A doutrina defendida pelo Opus Dei contém as raízes de uma verdadeira cultura democrática moderna. O catolicismo tradicional não contém, como exemplificado por Portugal. Mas a reacção que o Opus Dei levanta em Portugal mostra que os portugueses não têm uma cultura democrática nem estão inclinados tão cedo a possuí-la.

5 comentários:

Euro2cent disse...

"""
De uma relação de subordinação do laicado ao clero, passa-se para uma relação de igualdade entre os dois grupos.

A doutrina defendida pelo Opus Dei contém as raízes de uma verdadeira cultura democrática moderna.
"""

Chachada. A César o que etc., mais o sapateiro e a chinela.

A porra da democracia foi sobre-vendida pelos jacobinos, que se borrifaram para o Políbio e fizeram dela uma santinha de pau carunchoso sob cujo andor praticaram os maiores desmandos, mas sempre com grande imprensa.

O povo quer é viver bem sem ser chateado com perguntas estúpidas de quem devia saber o que faz.

Anónimo disse...

PA, tem muita razão. A Igreja Católica padece de muito clericalismo e esse é um velho pecado que os próprios leigos realimentam, como diz. Toda a questão está em converter os clérigos a uma espiritualidade de serviço, como agora Bento XVI demonstra com a sua renúncia. Já leu o discurso que ele fez na última Epifania, em que diz (nada mais nada menos) como deve ser um bispo?
Continue.
FC

Anónimo disse...

Porque será que há uma quantidade de gente que vem escrever comentários jocosos ou insultuosos, em vez de dialogar com serenidade? Gente danada!
FC

Euro2cent disse...

> comentários jocosos ou insultuosos

Porque o PA - que já escreveu coisas penetrantes e elucidativas - se está a encantar com uma chachada.

A "democracia" é uma peça bem polida da máquina de "manufacture of consent" que os donos dos países anglo-saxónicos desenvolveram a partir do século XVIII, com raiz no protestantismo luterano.

O seu papel é semelhante àquela técnica de vendas onde o vendedor finge interessar-se pessoalmente pelo comprador, para o envolver emocionalmente no resultado do negócio.

Já está sereno que chegue assim?

Pedro Sá disse...

Cultura democrática PA? Com o director espiritual a dar ordens aos membros da OD sobre a sua vida pessoal????