09 março 2012

sobre a cabeça



Uma das principais conclusões que se retira da doutrina católica, e talvez uma das mais surpreendentes é a de que a verdade se revela nos extremos. Esta conclusão contrasta radicalmente com o pensamento moderno, saído do protestantismo, segundo o qual a verdade não existe, ou não se pode lá chegar, ou não interessa para nada. Por isso, a cultura protestante suprimiu os extremos - o padre e o mendigo, o homem muito rico e o homem muito pobre - e conduziu a uma sociedade muito mais igualitária.
Porém, se o catolicismo está certo e a verdade só se revela nos extremos, então, as sociedades protestantes ficaram sem poder saber se as ideias e as instituições em que assentam são verdadeiras ou falsas. E para testar a verdade destas ideias e instituições, o mais prático e imediato é recorrer a uma sociedade de tradição católica, pois só aí é possível levar tudo ao extremo.
Interessa-me a esta luz olhar a questão da democracia. Aquilo que se está a passar em Portugal e, mais avançadamente, na Grécia é um teste à questão de saber se a democracia é ou não um regime verdadeiro para governar uma nação. O país, sob um regime democrático, foi levado a condições extremas. A questão é agora a de saber se ele vai conseguir sair destas condições extremas ainda através da democracia. Eu julgo que não vai.
De resto não é a primeira vez na sua história que Portugal submete a democracia a este exame e ela chumba, e o mesmo se pode dizer da Grécia, da Espanha ou da Itália. Os países católicos são os verdadeiros laboratórios da humanidade - uma ideia ou instituição que, a prazo, não funcione num país católico, não funciona em mais lado nenhum.
E o que dizer dos países protestantes? A conclusão dos países católicos tem validade universal. É igualmente verdade que, quando submetida a condições extremas, a democracia não resiste nesses países, como a República de Weimar demonstrou conclusivamente naquele país que é, na minha opinião, a verdadeira pátria da democracia moderna - a Alemanha (e não a Inglaterra).
Questão diferente é a de saber como se faz a transição de um regime democrático para um regime autoritário. Aqui, a história parece sugerir que nos países católicos a transição se opera por intermediação dos militares, ao passo que nos países protestantes é a própria democracia ou o povo a escolher a figura de autoridade. No primeiro caso, a figura de autoridade que governa o país está sujeita a um poder - o dos militares. No segundo caso, não existe nada nem ninguém que limite a figura da autoridade.
Os extremos que a cultura católica permite são também as portas de saída de um regime democrático para outro qualquer. A cultura protestante, pelo contrário, não consentindo os extremos, não tem portas de saída. Num país de cultura católica, quando o edifício democrático cai já não há ninguém lá dentro. Na cultura protestante é pior, assemelha-se às torres gémeas. O edifício cai com as pessoas todas lá dentro. Cai-lhes sobre a cabeça.

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