23 janeiro 2012

igualdade

Num post anterior citei Tocqueville na observação de que a cultura católica é bem capaz de ser aquela que melhor predispõe as pessoas para a igualdade e, portanto, para a democracia. E isso deve-se ao facto de, na comunidade religiosa, os dogmas da fé serem iguais para todos, o pobre e o rico, o poderoso e o fraco, o sábio e o ignorante. É assunto não negociável, todos comem da mesma comida espiritual, não há excepções.

A que tipo de igualdade Tocqueville se refere? Não certamente à igualdade económica, de poder ou de sabedoria, porque nessas matérias os católicos aceitam desigualdades e das grandes, e o próprio Tocqueville as menciona. Aquilo que a cultura católica não aceita é desigualdades de tratamento, não de tratamento formal, que um seja tratado por Dr. e o outro não, porque essa ela também aceita. Não aceita é desigualdades na dignidade humana, que uns sejam filhos e outros enteados.

A cultura católica aceita que o Presidente ganhe mais que os outros, aceita que ele tenha mais poder que os outros, aceita até que ele seja mais sábio que os outros, é capaz até de o tratar de uma maneira que mais ninguém o trataria no mundo, Sua Excelência, o Presidente da República, Professor Doutor fulano de tal. Mas aquilo que ela radicalmente não aceita é que todos, no âmbito do sector público, sejam chamados a fazer o sacrifício de serem privados dos subsídios de férias e de Natal, e o Presidente da República, que também é um funcionário público, seja uma excepção. Isso ela não aceita. Por isso, não passarão muitos dias até que o Presidente renuncie aos subsídios. Mas o mal já está feito. Devia tê-lo feito há mais tempo.

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