10 janeiro 2012

estações espaciais

Reproduzo parcialmente a seguir um artigo que publiquei no Jornal de Notícias em Julho de 1993 sob o título "Michael Porter". Era primeiro-ministro o Prof. Cavaco Silva e ministro da Indústria o Eng. Mira Amaral.

"(...)
O Governo português anda desde há algum tempo preocupado em definir uma estratégia económica para Portugal. A história do país ocasionou que ele se especializasse em certas indústrias, como os têxteis e o vestuário, o calçado, os produtos da madeira, o vinho, o turismo, e mais recentemente, as peças para automóveis. Nenhum governante, porém, se sente feliz a dizer que o seu país produz principalmente têxteis e vestuário, calçado, produtos da madeira, vinho ou serviços turísticos. Estas são as indústrias típicas de países em vias de desenvolvimento. Até a indústria automóvel já se tornou incompetitiva nos países ricos e constitui hoje em dia uma indústria em fase de transferência para os países de mão-de-obra barata.

As indústrias que fariam um governante feliz são as indústrias de ponta, cérebro-intensivas, indústrias de alta tecnologia: fibras ópticas, telecomunicações, biotecnologias, talvez mesmo a indústria espacial. É certo que em Portugal se produziram tradicionalmente têxteis e vestuário, calçado, produtos da madeira, vinho, turismo, e mais recentemente, peças para automóveis. Mas não estariam os portugueses, liderados pelos seus governantes, vocacionados para a produção de fibras ópticas, para as telecomunicações, para as biotecnologias, talvez mesmo para a produção de estações espaciais?

O melhor seria perguntar ao Porter. E assim se fez. Através do Ministério da Indústria, o Governo encomendou um estudo à empresa "Monitor" - um estudo que terá custado trezentos mil contos. O objecto do estudo consistia em determinar quais as indústrias em que Portugal possuía vantagens competitivas e, portanto, as indústrias onde o Governo deveria assentar a sua estratégia de desenvolvimento do país. Por vantagens competitivas, no jargão dos economistas, entende-se o conjunto de factores que permitem a um país produzir um certo bem ou serviço em condições mais vantajosas que a concorrência internacional, como, por exemplo, a disponibilidade de conhecimentos técnicos de produção, mão-de-obra treinada, conhecimento dos mercados, disponibilidade de matérias-primas, etc.

Portugal sempre produzira predominantemente têxteis e vestuário, calçado, produtos da madeira, vinho, turismo, e, mais recentemente, peças para automóveis. Por isso, em Portugal, existem conhecimentos técnicos de produção, mão-de-obra treinada, conhecimento dos mercado e matérias-primas predominantemente vocacionados para produzir têxteis e vestuário, calçado, produtos da madeira, vinho, turismo e, mais recentemente, peças para automóveis. Porém, não era certo que não existissem algures escondidos no país conhecimentos técnicos de produção, mão-de-obra treinada, conhecimento dos mercados e matérias-primas vocacionados para a indústria das fibras ópticas, das telecomunicações, das biotecnologias, da produção de estações espaciais - enfim, para alguma daquelas indústrias que todo o governante de um país em vias de desenvolvimento gostaria de ter no seu país. Nos aerópagos internacionais, ele seria agora o objecto da admiração dos seus colegas ministros: "Nós lá em Portugal especializamos na produção de estações espaciais...".

Por tudo isto, era preciso perguntar ao Porter.

A "Monitor" demorou alguns meses a elaborar o estudo. O estudo era aguardado com enorme expectativa pelos governantes, pelos empresários, pelos jornalistas, pelos académicos, pelos gestores, pelos sindicatos. O que é que o futuro imediato nos reservaria, fibras ópticas, telecomunicações, biotecnologias, estações espaciais?

O estudo foi revelado ao público recentemente na Exponor. Segundo o veredicto de Michael Porter e dos seus colegas da "Monitor", Portugal é um país que possui vantagens competitivas nas indústrias seguintes: têxteis e vestuário, calçado, produtos da madeira, vinho, turismo e peças para automóveis"

(in P. Arroja, Abcissas - Crónicas do Jornal de Notícias, Porto: Areal, 1993, pp. 307-8)

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