Num extremo, na aba direita da distribuição, está um pequeno número de pessoas, que não representam mais de 2 a 3% da população total do país. É a elite. Convém relembrar algumas das suas características principais: virilidade, racionalidade, sentido da verdade e da justiça, religiosidade, autoridade, generosidade, primando pelas coisas do espírito. No outro extremo, na aba esquerda da distribuição, representando também uma pequena percentagem da população, está a faixa mais radical do povo, essencialmente efeminado, emotivo, sem sentido da verdade e da justiça, irreligioso, egoísta, igualitário, e vivendo exclusivamente para gratificar o corpo. No centro da distribuição, representando a quase totalidade da população está a grande massa do povo.
Portugal e a cultura católica vivem desta relação entre opostos e complementares, entre a elite e o povo. É como a relação entre um homem e uma mulher, em que o homem dá as coisas do espírito e a mulher dá as coisas do corpo. O português equilibrado é aquele que está no centro da distribuição, que conjuga as características opostas do povo e da elite numa proporção adequada: não é muito dado às coisas do espírito, mas também não as despreza; gosta de gratificar o corpo, mas não leva a gratificação ao exagero. Mas em Portugal, há de tudo, como é próprio de uma cultura católica. É possível encontrar pessoas que conjugam aquelas características opostas em todos os graus imagináveis, desde o ponto mais remoto da aba esquerda da distribuição, até ao ponto mais remoto da sua aba direita.
Não é possível caracterizar Portugal e a comunidade dos portugueses de uma maneira que seja válida para sempre, porque a cultura católica é uma cultura que oscila entre extremos muito amplos, sempre à procura do equilíbrio - a imagem de um pêndulo. Há quarenta anos atrás, Portugal era uma sociedade onde predominavam os valores da aba direita da distribuição; hoje, passada uma geração apenas, é uma sociedade onde predominam os valores da aba esquerda.
Em cada momento, Portugal pode ser tudo, até uma sociedade extraordinariamente intolerável, como já tem sido em vários períodos, embora curtos, da sua história. E pode ser intolerável de duas maneiras diferentes, quando são dominantes, ao ponto de se tornarem avassaladores, os valores caracteristicos e extremos da aba esquerda da distribuição - que são os valores da faixa mais baixa do povo - e quando predominam exclusivamente e ao exagero os valores característicos e extremos da aba direita da distribuição - que são os valores da faixa mais alta da elite, o clero.
No primeiro caso Portugal, torna-se uma sociedade caótica, tipicamente igual àquilo que seria uma sociedade feita só de mulheres, sem autoridade nem hierarquia, emotiva, desgovernada, tagarela, sem qualquer sentido de verdade ou de justiça, uma sociedade de aparências, materialista, igualitária, totalmente entregue à gratificação do corpo. No segundo caso, Portugal torna-se uma sociedade beata, igual àquilo que seria uma sociedade feita só de padres, extraordinariamente racional e, por isso, radicalmente intolerante, autoritária, hierárquica, hirta, às vezes violenta, exclusivamente entregue às coisas do espírito. Portugal pode ser tudo isto, ou qualquer coisa intermédia, e já foi tudo isto no passado. Actualmente, está mais para o primeiro lado - o lado esquerdo da distribuição. Na procura do equilíbrio, o pêndulo vai ter agora de balancear para a direita.
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