Ao contrário do Joaquim, eu penso que o problema dos deolinda é um problema cultural. É o problema de eles terem nascido e crescido numa cultura onde, ancestralmente, uma licenciatura dava acesso a uma vida de privilégio. Aquilo que eles querem - segurança de emprego - é um privilégio. Pergunte-se ao homem do povo se ele tem segurança de emprego, e observe-se a resposta.
Enquanto o acesso á universidade era restricto, e as licenciaturas escassas (um bem raro), era possível aos licenciados o acesso a uma vida profissional privilegiada. Desde que o acesso á universidade se massificou - e os deolinda são a primeira geração do ensino universitário massificado -, os privilégios acabaram. Passou a haver muita oferta de licenciados em relação à procura, excesso de oferta, e as consequências não podia ser outras, fim dos privilégios (renda económica, no jargão dos economistas).
A manifestação dos deolinda é o exemplo acabado daquilo a que os economistas chamam "rent seeking", o qual é um comportamento típico da cultura portuguesa, e que se traduz em vender um bem ou serviço a um preço acima do seu valor de mercado, normalmente em resultado de uma disposição legal (v.g., licenças) ou por outra qualquer acção do poder coercivo do Estado v.g., ser o próprio Estado o comprador do bem ou serviço).
Portugal perdeu muitas rotas comerciais no Oriente depois dos Descobrimentos porque, uma vez descoberto o caminho marítimo para a Índia, os portugueses instalaram-se em tudo o que era estreito a cobrar licenças de passagem (portagens) a todos os barcos que lá passavam. Ainda hoje todo o português que atinge alguma posição ou realiza algo, a sua primeira preocupação é procurar o apoio do Estado para tornar essa posição vitalícia. A cultura portuguesa é uma cultura de rent-seekers: instalam-se em posições de privilégio e ficam lá agarrados como lapas para o resto da vida, nunca mais de lá saem nem ninguém os consegue tirar de lá.
Sem comentários:
Enviar um comentário