O estado de espírito com que, na passada 4ª feira, António Barreto deu esta entrevista à SIC-N, na qual é evidente a sua desilusão com o que vai sucedendo na Pátria, foi o mesmo com que eu, enquanto assistia ao debate parlamentar desse mesmo dia, escrevi o meu artigo desta semana na "Vida Económica", intitulado "Pobre Rectângulo" (ler em baixo):
"Escrevo perante a iminência do anúncio de eleições antecipadas. E que, no imediato, em nada beneficiarão o País. Não se trata de desculpar a governação dos últimos seis anos – e não seis semanas, como tão bem notou Manuela Ferreira Leite –, mas simplesmente de constatar que, na urgência de captar fontes de financiamento, a presente crise política apenas piorará a já muito deteriorada conjuntura – e estrutura – portuguesa. Assim, lamento que, tal como sugeri na crónica da semana passada, o Presidente da República tenha sido incapaz de exigir uma solução de compromisso, de cariz presidencial, e que o Partido Socialista, em especial, não tenha sido mais cooperante na busca de uma alternativa à equipa ministerial de José Sócrates. Neste particular, a própria relutância (ou melhor, indisponibilidade) do Primeiro Ministro, e Secretário-Geral do Partido Socialista, em facilitar a transição de liderança no actual quadro legislativo, cenário no qual se viabilizaria uma grande coligação de interesse nacional, demonstra bem, mais do que vãs palavras, quem são aqueles que, sim, estão agarrados ao poder. Enfim, ser patriota é colocar a Nação à frente dos interesses particulares e partidários, e não o contrário.
Assumindo que o País vai mesmo para eleições antecipadas, estaremos três meses com um Governo de gestão corrente, a ver cair os pingos da chuva, até que, finalmente, alguém seja indigitado para tomar decisões a sério. Pelo caminho, teremos de nos financiar em mais de dez mil milhões de euros, pagando, por estes empréstimos, taxas que, já sabemos, não temos capacidade para pagar. Dir-se-á: travão a fundo nas despesas! Pois, mas, infelizmente, como esse esforço não foi feito em tempo devido, chegámos a uma triste situação em que, segundo notícias divulgadas esta semana pela imprensa económica, já existem várias empresas públicas na iminência de secarem os seus fundos de maneio. A greve dos maquinistas da CP – uma das empresas mencionadas nas tais notícias – parece ser o prenúncio de muitas outras manifestações de desagrado que, provavelmente, serão desencadeadas por motivos bem mais graves que aqueles que agora se invocam. Sem dinheiro nem ordem (política), a paralisia que se vai instalar no País será o derradeiro golpe de misericórdia rumo à balbúrdia geral.
Caros leitores, não me interpretem mal: este Governo não merece a permanência no cargo. E este Primeiro-Ministro menos ainda. Mas, francamente, é uma decepção que uma democracia como a nossa, que se diz madura, não seja capaz de dialogar, substituir quem agiu clandestinamente e, assim, evitar um suicídio colectivo desta natureza. Enfim, estamos prestes a voltar ao século XIX, a 1891, quando, pela última vez, o Estado português declarou bancarrota. É triste e é algo de que nenhum patriota se deve orgulhar. Mas, por outro lado, tentemos ver o lado positivo da coisa: com uma intervenção externa à vista, talvez, através dos observadores externos que implementarão e avaliarão os termos dessa mesma ajuda, se consiga devolver alguma moralidade ao sistema, perseguindo e eliminando as despesas sem nexo e encapotadas que persistem em existir na máquina do Estado e no aparelho político partidário que o assiste. Talvez, assim, se consiga devolver a esperança numa verdadeira ética política, hoje quase inexistente, sem a qual, não dando o exemplo, nenhum Estado pode exigir sacrifícios seja lá a quem for.
Entretanto, como também aqui tenho insistido, o País deve preparar um plano B. A injecção de liquidez, que, directa ou indirectamente, os nossos parceiros nos irão conceder, será um mero balão de oxigénio, temporário, se nada de muito mais se fizer. Ora, se queremos viver no seio de uma Europa aberta, em concorrência com o resto do mundo, teremos de nos tornar mais europeus e menos portugueses – no que isso tem de fácil e, sobretudo, no que isso tem de difícil –, podendo assim beneficiar de alguma simpatia quando chegar a hora de alguém ter de nos perdoar parte da nossa dívida. Este é o plano B1. A alternativa é o B2 e consiste em permanecermos bem portugueses – no que isso tem de bom e, sobretudo, no que isso tem de mau –, à deriva, isolados neste pequeno e, cada vez mais pobre, rectângulo.", edição de 25/03 (jornal "Vida Económica").
Enfim, é preciso que surja gente nova, e capaz, na política portuguesa. Gente que dignifique o Parlamento. Gente isenta. Gente razoável. Pois, infelizmente, a malta que, neste momento, lá anda, com uma ou outra honrosa excepção, não representa mais do que um bando de fanáticos políticos.
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