A tese do Joaquim é interessante e pode até ter um grão de verdade. Procurando exprimi-la nas minhas próprias palavras, esta é uma geração que foi educada num ambiente europeu, a primeira a sê-lo desde que Portugal aderiu à UE. É uma geração que tem uma perspectiva de vida internacional, sobretudo europeia, como nenhuma outra tinha tido antes no país.
É uma geração que possui, em geral, educação universitária. A prosperidade dos anos 90 deu-lhe possibilidades de viajar, muitos frequentaram o Erasmus num país estrangeiro. Mais importante ainda, é a primeira geração a ter acesso às televisões estrangeiras e também à internet dando-lhe uma perspectiva dos países estrangeiros, ainda que à distância, que nenhuma outra teve no país.
Esta geração exige, portanto, que Portugal se torne mais europeu, e isso significa uma governação responsável e transparente, a abertura da sociedade, maior competitividade na economia, a selecção pelo mérito, a regra da lei, condições de segurança económica que sejam iguais para todos, e não o privilégio de alguns, etc.
Penso que esta é, na essência, a tese do Joaquim. Esta geração quer um Portugal europeu, e não um Portugal africano, que é como o Financial Times aparentou o país esta semana.
Eu gostava de partilhar o optimismo do Joaquim. Mas tenho uma interpretação muito mais pessimista do fenómeno. Na minha interpretação, esta geração aquilo que quer é um Portugal mais português, aquilo que Portugal tem de pior que é a tendência para o privilégio, fruto do excepcionalismo (católico) da sua cultura: "Nós somos especiais, somos educados, temos cursos superiores (não importa em quê), portanto, dêem-nos uma situação económica compatível com as nossas qualificações formais". Como se um curso superior conferisse um direito na vida que há-de ser satisfeito à custa de todos os outros, normalmente através do Estado.
Aquilo que a manifestação de Sábado reclamava não era, primariamente, um emprego, um trabalho, um ganha-pão. Reclamava uma coisa muito diferente, reclamava segurança de emprego, batendo-se contra a precaridade e os recibos-verdes. Eu estou muito convencido que no dia em que qualquer dos manifestantes conseguir um emprego bem pago e seguro - o que normalmente só se consegue no Estado - vai ficar lá sentado para o resto da vida, exactamente da mesma maneira que aqueles que agora os possuem permanecem resfastelados nas suas respectivas poltronas. E que daqui por vinte anos, os filhos deles estarão a apresentar contra eles exactamente as mesmas reivindicações, que eles agora apresentam contra os outros.
Não existe espírito público num povo de cultura católica, como é o povo português. Isso é uma característica da elite que neste momento não se sabe onde anda. Entregue ao povo, o espaço público é uma espaço onde cada um procura tratar da vidinha o melhor que pode, a expensas dos outros, e estando-se nas tintas para os outros. Entregue ao povo, o espaço público é destruído, a começar pelo dinheiro público.
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