As medidas anunciadas hoje pelo Governo de José Sócrates evidenciam duas coisas. Em primeiro lugar, que a execução orçamental de 2011 - ao contrário do que tem sido veiculado repetidamente pelo Primeiro Ministro - não está a decorrer de forma sustentável, logo, não pode ser boa. E que, não controlando o Monstro, o recurso ao aumento dos impostos está prestes a esgotar-se. Em segundo lugar, que o Governo está totalmente à mercê das circunstâncias, desgovernado e sem conseguir antecipar os acontecimentos.
Assim, se há aspecto que, na minha opinião, descredibiliza o actual regime democrático português - porventura, noutros países também - é a inimputabilidade política conferida aos agentes políticos que, ora prometendo fantasias, contrariam o manifesto eleitoral que os fez eleger, adoptando, em alternativa, medidas que nada têm a ver com o (outrora) prometido. Infelizmente, é isso que tem sucedido - e alarvemente - nesta segunda legislatura de José Sócrates. E sublinho a expressão "segunda legislatura".
Se analisarmos o que, politicamente, se tem passado na Grécia e na Irlanda chegamos a realidades distintas daquela que encontramos em Portugal. Assim, na Grécia, o Governo de Papandreou também fez marcha-atrás em relação ao seu manifesto eleitoral, mas fê-lo herdando o legado de um outro partido que o antecedera. Um legado fraudulento, como agora se sabe. Papandreou mantém-se, pois, no poder, sem que a sua credibilidade tenha sido dramaticamente afectada. Na Irlanda, pelo contrário, o partido que desencadeou o pedido de ajuda externa acaba de ser expulso, sendo que aqueles que agora tomaram o seu lugar - tanto o partido que ganhou a maioria relativa como aquele que com ele se vai coligar -, tomaram-no com base num mandato que prevê a renegociação da ajuda externa que a população, por sua vez, rejeitou convictamente.
Regressemos, entretanto, a Portugal. Ora, aqui reside um partido - o PS - que em 2009, no domínio perfeito da informação, prometeu mundos e fundos, para, desde então, fazer tudo ao contrário, em permanente contradição e em permanente estado de negação. Portugal é hoje governado a partir de Bruxelas, que instrumentalizou um Governo, aparentemente, soberano, sendo que este se deixou deslegitimar. Enfim, na minha opinião, o problema nem é especialmente José Sócrates, que, sendo um político profissional, está agarrado ao poder e a tentar safar-se da maneira que melhor sabe. O problema é mais grave e diz respeito aos "checks and balances" do nosso regime político, que se fosse decente já teria substituído um Primeiro Ministro nestas circunstâncias ou mandado o país a votos. Além disso, se não temos dinheiro e estamos limitados a seguir aquilo que nos mandam fazer, então qualquer um serve. E se assim é, que seja alguém revelador de um mínimo de honestidade intelectual. É que nesta altura de aperto, com o país (e não apenas esta ou aquela geração) à rasca, mais do que nunca, é preciso respeitar os Portugueses que, não nos esqueçamos, é quem o Governo tem de realmente representar.
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