As medidas de austeridade apresentadas ontem eram previsíveis, inevitáveis e, porventura, são ainda insuficientes. Ao contrário do que o Joaquim sustenta em baixo, eu não as considero estúpidas; mas são descoordenadas e revelam uma enorme desorientação política de um Governo que, depois de tanto negar a evidência, dificilmente terá a credibilidade para as implementar. Mas vamos às medidas em concreto.
Primeiro, as reduções nos salários da função pública. Depois de ter defendido esta medida, durante tantos meses, recorrendo a diversos estudos e indicadores, vou abster-me de a comentar. Já disse o suficiente e já fui suficientemente repreendido - e insultado - por escrever aquilo que penso e que a realidade, infelizmente, veio confirmar. Vou apenas dar a minha estimativa do impacto orçamental que a medida poderá ter em 2011: cerca de 850 milhões de euros.
Segundo, a redução de 20% no Rendimento Social de Inserção, que permitirá uma poupança de 75 milhões de euros. Quanto às alterações na política de atribuição do abono de família, não existem ainda grandes detalhes, por isso, é difícil estimar grande coisa. Sabe-se apenas que existem cerca de 1,7 milhões de benefíciários.
Terceiro, o aumento do IVA em dois pontos percentuais para 23% e a mudança de escalão associado a alguns produtos e serviços. Atendendo à evolução da execução orçamental, diria que, nesta rubrica, o Estado português conseguirá aumentar a cobrança em 1100 a 1200 milhões de euros. Sendo certo que o IVA é o imposto mais fácil de cobrar e aquele que mais pesa no total de receitas fiscais (neste momento, representa já 40% do total), a verdade é que o grau de execução atingido em Agosto faz pensar que, tudo o resto igual, o argumento associado à curva de Laffer poderá estar prestes a entrar em cena. Ou seja, que a aumentos do IVA a partir do nível actual não estejam associados aumentos proporcionais na cobrança fiscal. A estimativa de 1100 a 1200 milhões de euros poderá, pois, revelar-se optimista. Por fim, em matéria de impostos, a redução dos benefícios fiscais. Segundo os dados que têm surgido na imprensa, a poupança associada a este componente da despesa fiscal será de 400 milhões de euros.
Concluindo, as minha estimativas de poupança, entre cortes na despesa e aumentos nos impostos, anda na casa dos 2500 milhões de euros acrescidos da poupança associada aos abonos de família que, neste momento, eu não sei estimar com precisão. Quer isto dizer que, dos 5000 milhões de euros anunciados ontem pelo Governo, metade está ainda por quantificar. A minha sensação é que uma boa parte desse montante indefinido virá da redução das transferências para os fundos e serviços autonómos, para as autarquias e para as regiões. Neste aspecto, há espaço para reduções (o valor das transferências correntes é hoje de 9000 milhões de euros por ano), porém, o custo económico será o agravamento do centralismo que, infelizmente, a par de muitos outros problemas, é um dos principais obstáculos ao desenvolvimento do país.
Uma última nota: a ideia do orçamento de base zero, apresentada por Francisco Louça, é muito interessante, pois permitiria aferir se, de facto, as despesas com consumos intermédios do Estado são realmente assim tão insignificantes quanto as estatísticas dão a entender. É claro que, não obstante a valia teórica da proposta, esta nunca poderia ser executada por partidos - muito menos o BE. Se a ideia do orçamento de base zero fosse para a frente, teria de ser executada por técnicos, porque de políticos já estamos todos fartos.
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