O artigo publicado na semana passada no "New York Times", por dois reputados comentadores, acerca da periclitante situação da economia portuguesa não contem nada de novo. É a mesma mensagem que vários analistas têm passado há meses - alguns há anos -, em Portugal e no estrangeiro, de forma mais ou menos veemente. Ou seja, que em face dos desequilíbrios estruturais da nossa economia, em particular da dicotomia entre aquele Portugal que vive na lua do Estado e do Portugal que vive na terra do dia a dia, o país corre o risco de uma morte lenta. E que se, nos últimos anos, nos mantivemos à tona da água foi porque tivemos a benesse de, pertencendo à zona euro, termos tido a possibilidade de recorrer a sucessivos empréstimos. Mas, agora, a festa pode estar no fim.
No último mês, a Grécia parece ter conseguido manobrar os corredores do poder político e, parece, ter obtido o apoio financeiro da UE e do FMI. A questão que se coloca é: e se outros precisarem de tratamento semelhante? Estarão os alemães dispostos a isso? Infelizmente, julgo que não. Por isso, a bem da equidade, estou hoje convencido de que a melhor solução seria um "default" da Grécia, pois o seu incumprimento levaria à diferenciação do risco soberano na Europa - a única forma de travar a indisciplina orçamental de alguns, premiando o bom comportamento de outros. O contrário será manter a permissividade, e o incentivo, em relação à violação das regras - esta, sim, a verdadeira caixa de Pandora, cujos efeitos perdurarão durante décadas. E, pior, se por acaso a Europa salvar os gregos não salvando depois outros que também necessitem de ajuda, então, criar-se-á uma outra situação de enorme injustiça. Como aconteceu nos EUA quando, depois de se resgatar a Bear Stearns, se deixou cair a Lehman Brothers...
Os críticos desta hipótese, deixar cair a Grécia, mencionam que a exposição dos bancos franceses e alemães é de tal forma grande que, na prática, inviabiliza essa mesma hipótese. Não estou nada certo disso, além de que, a exemplo do que foi feito em 2008, esses bancos mais afectados poderiam ser intervencionados - se os Governos da França e da Alemanha assim o entendessem. Se, por absurdo, toda a dívida grega expirasse amanhã e toda ela fosse detida por investidores franceses e alemães - dois pressupostos que não se verificam - o impacto económico no conjunto dos dois países seria de 8% do PIB. Ou seja, péssimo, mas não catastrófico. Quanto ao efeito contágio, também não me assusta. Apesar de todos os problemas em Portugal, e em Espanha, o nível de endividamento público (editado: no post original, por omissão, lia-se apenas "endividamento") não chega sequer perto daquele que se vislumbra na Grécia. Infelizmente, o grande risco, é que se ninguém nos parar para lá caminharemos!
E em relação à integridade do euro, o incumprimento grego não colocaria a moeda única em risco, pelo menos, não nos países que fazem desta moeda uma alternativa séria ao dólar. Quanto muito, o incumprimento grego colocaria em risco a presença grega no euro e nunca devido à ameaça externa, conduzida pelos outros países europeus, de excluir a Grécia do clube. Pelo contrário, se essa pressão existisse seria motivada internamente, pelos próprios gregos, em resultado do ajustamento estrutural que os credores internacionais exigiriam ao país. Quanto a Portugal, a subida das "yields" e o exemplo grego seriam motivos mais do que suficientes para arrepiarmos caminho face aos erros macroeconómicos e fiscais cometidos nos últimos dez anos. Essa é de resto a minha esperança, pois, ao contrário da Grécia, ainda estamos a tempo de nos salvarmos...
Enfim, há algum tempo que aqui escrevo que o melhor que poderia acontecer a Portugal - e à Grécia - seria a cedência da gestão da nossa política orçamental a um Governo económico da Europa, que é, precisamente, aquilo sobre o qual se começou a especular nos últimos dias em Bruxelas. E que esse passo seria mais um no sentido de maior integração política da zona euro. Mas isso seria o melhor do ponto de vista do prevaricador! Porém, colocando-me no lugar dos outros, nomeadamente no lugar dos alemães, será que é isto que eles pretendem? Quererão estes ficar com o ónus de comandar esta gente que não se governa nem se deixa governar? Confesso que começo a ter dúvidas e a persistente renitência dos alemães em, claramente, apoiarem um plano de resgate aos gregos poderá ser revelador. Como alguém, recentemente, me dizia, o euro é um clube privado e não, necessariamente, uma família. Talvez tenha razão. E, assim sendo, a melhor forma de manter a exclusividade de um clube privado é aumentar o valor da jóia a todos aqueles de que desconfiamos. Ora, a jóia deste clube é a "yield" das obrigações a dez anos.
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