26 setembro 2009

tragédia


Dentre as afirmações citadas neste post, há uma particularmente interessante. Trata-se de um cidadão britânico a viver na Andaluzia e que atribui aos espanhóis uma incapacidade endémica para relembrarem a história e imaginarem o futuro. Para eles só existe o AQUI e o AGORA.

Antes de prosseguir, eu gostaria de estabelecer o facto óbvio de que os portugueses são como os espanhóis e que Portugal só é hoje um país independente porque os espanhóis deixaram. Quanto à dupla incapacidade para relembrar o passado e imaginar o futuro, ela é o fruto da incapacidade de abstracção do homem ibérico, e da sua excessiva concentração no concreto (o AQUI e o AGORA).

A História é apresentada como um conjunto de acontecimentos, de histórias e de personalidades, e sem um qualquer fio condutor, aquilo a que já chamei um cemitério de factos. Como notei aqui, os próprios historiadores são incapazes de discernir tendências nos processos sociais, em parte porque estão obsessivamente concentrados nos factos. Neste quadro de espírito, aquilo que se relembra da história é a batalha de Aljubarrota, a Patuleia ou os romances amorosos do D. José, e não que a democracia-liberal foi várias vezes tentada em Portugal desde 1820 e falhou sempre. E sempre pelas mesmas razões - as mesmas que estão a encaminhá-la agora de novo perigosamente para o fim quer em Portugal quer em Espanha.

Se não há tendências no passado, para quê procurá-las no futuro, para quê procurar modelar o futuro à nossa vontade colectiva e como acreditar que essa vontade poderá de algum modo, ainda que imperfeito, materializar-se? Não existe razão para o fazer. O futuro fica abandonado e o passado, transformado em cemitério de factos mais ou menos interessantes, deixa apenas um foco de interesses - aquilo que se passa AQUI e AGORA. Nesta cultura, as pessoas não fazem acontecer as coisas. As coisas acontecem-lhes. A vida não é um projecto. É um destino, uma fatalidade. Daí o elemento de tragédia que a acompanha

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